segunda-feira, 4 de junho de 2018

"Farinha Pouca - Meu Pirão Primeiro"

O que leva um país, formado por uma população trabalhadora, com uma diversidade cultural, que se assenta sobre solo fértil e rico em matéria prima, mas vive em constante fragilidade política, com prepotência das classes mais abastadas sobre os mais humildes? A mesma pergunta sob outro ângulo: como é possível uma parcela considerável da população não ter qualquer capacidade de raciocínio político e se deixar levar por jornais tendenciosos e notícias falsas das redes sociais, replicadas sem qualquer análise mais apurada?
Fala-se muito da necessidade de investimentos governamentais em educação, já que outros países que assim fizeram mudaram o modo de vida do povo. No entanto, os que assim falam não dizem que investimento é esse e acabam caindo em um preconceito, já que essa incapacidade de análise política e perpetuação das mazelas não parte somente das pessoas mais humildes, os sem instrução, mas também de advogados, de jornalistas, de médicos, de professores (universitários inclusos), de pequenos proprietários etc.
Ora, as ciências sociais e humanas ensinam que há uma relação direta entre as ações do estado, a acentuada divisão de renda e a falta de instrução, ou de uma instrução mal feita, mal acabada. Acontece que a cultura competitiva, da concorrência, do "farinha pouca - meu pirão primeiro", contrária a cultura de parceria, da ajuda mútua e isso interfere no modo de ser, de querer e agir de um povo.
E o pior disso tudo é que miséria gera miséria, analfabetismo gera analfabetismo, assim como incapacidade política, gera incapacidade política; e a propagação acontece quer seja nos jornais, nas rádios, nas tevês, nas salas de aulas, nos clubes, no botecos etc. Como quebrar esse paradigma que se auto-alimenta e perpetua em um processo que repete políticas danosas, excludentes e que privilegia alguns poucos? É preciso, primeiro, entender a dinâmica do fenômeno que está dado e que inclui um conhecimento da história para então quebrar essa capacidade de reprodução.
Fala-se na necessidade de investir em educação, mas tem professores, graduados em licenciaturas de última hora, lecionando Filosofia e Sociologia a tecerem apologias a candidatos a presidente de República com discursos misóginos, homofóbicos, machistas e racistas. O mercantilismo vivido na educação leva às salas de aula profissionais sem qualquer capacidade de análise mais crítica sobre o mundo do seu entorno, da política e da economia e reproduzem as facilidades encontradas em pequenos textos, descomprometidos, simplistas e viciados.
É preciso largar mão de um simplismo perigoso, setorizado, e analisar a sociedade a partir de um entendimento complexo, de um corpo em funcionamento, um todo organizado e que se reproduz. A riqueza do solo, a riqueza econômica e diversidade cultural não deve ser analisada em separado dos interesses de classes, da distribuição da riqueza, das lutas por privilégios e manutenção do status quo.

sexta-feira, 1 de junho de 2018

Democracia , Intervenção e Ditadura

Cientistas políticos afirmam que o conceito de democracia, na essência, rivaliza com o de guerra, e estão certos, já que quando acaba a política, quando acaba a capacidade de negociar, as pessoas entram em conflito. Nesse caso, a democracia é então um regime político em que um dado povo tem a capacidade de se autogerir: um regime em que a governança acontece de forma partilhada.
Mas sobre isso há algo a ser dito: a democracia rivaliza não necessariamente com a guerra em si - a não ser que o conceito de guerra possa ser mais estendido do que comumente é apresentado - por que, por essência, a democracia rivaliza com toda e qualquer manifestação bruta da força física como modo de impor decisões de um único indivíduo ou de um grupo de indivíduos. Em outras palavras: democracia rivaliza com qualquer sistema de governo absoluto, monárquico, aristocrático - ditatorial.
Quando alguém aceita um sistema dessa natureza subentende-se que esse indivíduo o faz por dois motivos: primeiro, se ele tem algum laço de parentesco, ou de amizade, com o ditador, pois assim poderá ter algum tipo de vantagem pessoal; segundo, se não tem a menor noção do que está defendendo. Mesmo que todo ditador afirme que o que está fazendo é propriamente a democracia, isso não é verdade, em um regime ditatorial encerram-se as liberdades individuais e a capacidade cidadã de definir seus destinos.
É também chamado de regime totalitários e/ou autoritário: de um lado porque se faz  estado se faz presente e controla todos os setores da sociedade, de outro, porque o faz isso com a força das armas e de aparelhos de repressão. Em regimes dessa natureza há um controle sobre toda e qualquer forma de expressão (imprensa, cinema, música, livros, teatro e escolas), de modo que os mais incautos podem sentir até uma espécie de calmaria e a impressão de que tudo está normal.
Por outro lado, a implantação de uma ditadura, está intimamente ligada outros conceitos correlatos: golpe de estado, intervenção militar e manutenção da ordem. São correlatas porque na política não existe vácuo, todas as vezes que se fez intervenção, a intervenção se transformou em um sistema autoritário por extensão. As democracias tem erros, mas abdicar de um regime cidadão, de alguma forma de participação popular e desejar uma ditadura é, por assim dizer, animalesco, é recrudescer na escala evolutiva da humanidade e se desejar ruminante à espera que o dono lhe dê a ordem.