sexta-feira, 28 de abril de 2017

O Estado, o Político, e o Cidadão

A vida política de uma sociedade precisa ser vista dentro de um prisma que leve em conta a economia, as relações sociais, a história e, conseqüentemente, a cultura etc. O grande erro que se comete é vê-la como algo isolado, pensando-a como a causadora de todo o mal-estar dos grupos. Claro que alguns fenômenos políticos são próprios e podem ser vistos em separados como a prepotência de alguns governantes e burocratas, bem como as suas artimanhas pessoais e corporativas. Mas esses fenômenos estão dentro de um contexto maior que precisa ser evidenciado em uma análise mais elaborada; políticos e burocratas não são seres alienígenas, causadores – únicos - dos problemas sofridos pelo povo. O enfraquecimento do estado, com suas dificuldades de manutenção da segurança e da justiça, é conseqüência e não causa. Aliás, faz parte da cultura de um povo que tem um estado quase inoperante e já sem legitimidade e que o estabelece como sendo o causador de todas as mazelas, pois assim, se esquiva da culpa. Ou seja: o culpado é sempre o outro e cada um se vê como honesto, cumpridor de compromissos e distante de toda e qualquer perversidade do estado. Como todo mal só pode ser erradicado quando os seus causadores reconhecem-no em suas ações como mal, o não reconhecimento como causador da decadência do estado, faz com que não se vislumbra, em momento vindouro, a alteração do que se apresenta. Certamente que na atividade política se planta o poder nas mãos de indivíduos que nem sempre estarão preparados, o que pode causar o desvirtuamento das funções, mas essas pessoas são apenas mais alguém oriundos dos vários segmentos da própria sociedade. O estado, toda a sua burocracia e hierarquias, é apenas uma máquina produzida pela mesma sociedade e posta à sua disposição; sendo assim, precisa ser vista como parte inerente de cada indivíduo. A análise dos fenômenos particulares só devem acontecer isoladamente, como comodidade metodológica, mas sempre precisam estar integralmente relacionados com os vários outros setores. O estado não pode ser visto como um fim em si mesmo; as suas funções atendem às necessidades oriundas das pessoas, com as suas especificidades; é uma instituição social. Os agentes do estado, aqueles que controlam as forças públicas, as contas e a legislação são um extrato do restante do grupo; uma pessoa como qualquer outra e precisam se ver apenas como agentes, com ônus e bônus.

quarta-feira, 26 de abril de 2017

Em Decadência o Capitalismo e seu Construto, o Estado Moderno

Economia de mercado já se evidenciou, há mais de 2000 anos, entre os fenícios que saiam mar a fora comprando e vendendo ao longo do Mediterrâneo, mas o capitalismo moderno - tal qual se percebe nos dias de hoje - tem seu início ainda na Idade Média, nos tempos das Cruzadas e, atualmente, dá as linhas políticas, religiosas e culturais por toda a modernidade. A chamada acumulação primitiva de capital aconteceu quando os cruzados, ao retornar da Terra Santa, traziam para a Europa especiarias, tecidos e utensílios que fascinavam os europeus. Mas, muito diferente do que alguns entusiastas consideram, o sistema capitalista de produção teve uma data de nascimento e tem um prazo de existência e, nos momentos atuais, já demonstra sinais de fadiga. A sua demonstração de fraqueza é inerente às suas características essenciais como a contínua ingerência nas ações do estado, a necessidade constante de inventividade, a necessidade de crescimento contínuo, a importância de um aumento constante de lucratividade etc. Alias, nesses tempos, chamados por alguns de pós-modernidade, se percebe a decadência do estado que um dia fora feito e refeito para aconchegar o capitalismo necessitado da segurança das lei para seus empreendimentos. O chamado estado nacional, ou moderno, feito a imagem e semelhança das necessidades da burguesia dos séculos 17 e 18, então classe em ascensão, foi invadido de vez pela voracidade do próprio sistema econômico e sua decadência começa a ficar clara. O que se quer dizer é que naquilo que a economia não afetou pelas entranhas do estado, corrompendo os agentes condutores da máquina burocrática, afetou-os ideologicamente, ditando preceitos e tendências que interferem nos modos de condutas. Com a atual decadência do sistema econômico estremece também o estado moderno com suas divisões de poder, o seu conceito de democracia e toda a racionalidade burocrática que lhe são inerentes. Para onde tudo se encaminha? Alguns pensadores se dão ao trabalho de fazer prognósticos falando do fim do capitalismo, de novos modos de produção, de novas estruturais sociais. Tudo são apenas prognósticos. Tudo subjetividade. O que parece claro é que há uma lógica de que tudo que um dia nasce, um dia morre e que, por isso, as mudanças são inevitáveis; e já se vislumbra no horizontes novas concepções de mundo, novos modos de agir e novos tipos de relações humanas.

segunda-feira, 24 de abril de 2017

Os Homens e a História

Uma complexidade muito grande cerca o entendimento do conceito de história; primeiro porque essa pode ser entendida como o percurso da existência dos humanos no planeta Terra, mas também pode ser pensada como ciência, comprometida com um objeto definido, metodologia, produção bibliográfica e um conjunto de outros pontos necessários. No entanto, como o seu entendimento não tem a pretensão de verdades absolutas, as interpretações correm soltas por aqueles que pisam e repisam sobre definições de objeto, de métodos científicos e dão os seus palpites a respeito de fatos vivenciados. Por outro lado, é preciso pensar o uso inadequado da história, voluntariamente, quando se tenta provar algo do presente com ocorrências já vividas. Nesse caso, surge um grande problema de cunho histórico e historiográfico: as interpretações são feitas a bel-prazer daquele que quer dar fundamentos de verdade às suas ações, ou ações que visam a sua defesa. É comum que as pessoas distorçam fatos, mudem datas, acrescentem ou tirem pontos, criem dados falsos, mas que – assim - se aproximam daquilo que querem dar credibilidade. Nas guerras e conflitos gerais entre os povos, governantes se perdem com a preocupações em narrar fatos contrários ao seu adversário, enfatizando fatos a seu favor; há quem afirme que, numa guerra, o primeiro que morre é a verdade. Portanto, no fim do conflito, quem conta a história é o vencedor; e aí se elimina um mito muito comum entre grupos de historiadores que falam em “história dos vencidos”. A história é a história; são fatos. Mas seus relatos sempre foi o dos vencedores. Surge então, outro ponto importante: se o vencedor de um evento fosse esse e não aquele, como seria o mundo de agora? Mas a história não tem "se": os fatos ocorrem ou não ocorrem. Perguntas que se fazem: se Hitler tivesse vencido, como seria o mundo hoje?, se o Brasil ainda fosse monarquia, a economia seria melhor?, se não fossem os portugueses a descobrir, o País estaria desenvolvido? Ou, se Getúlio não tivesse cometido suicídio, o golpe dos militares não teria acontecido? São questões que não possuem sentido fundamental porque são linhas imaginárias. A história é concreta, construída por homens e mulheres, na mesma medida que essa também foi sua construtora em luta pela existência. A complexidade e o mal entendimento da história leva ao seu mal uso, a práticas desconectadas com os fatos, portanto errôneas; essas práticas errôneas levam de novo ao mal entendimento, à complexidade e assim tem-se caminhado por longos anos.

sexta-feira, 21 de abril de 2017

Averrois, Deus e a Razão

O pensamento filosófico, pela tradição, tem origem na Grécia antiga (em geral exclui-se indianos e chineses), mas um espanhol de origem árabe, de religião muçulmana, não pode ficar de fora, Abu-al-Walib Mohammed ou, afrancesadamente, Averrois. Ele nasceu, viveu e morreu na península ibérica, em Córdoba, durante o período que a região foi tomada pelos mouros invasores que entraram pelo norte da África. Averrois não pode ficar de fora da história do pensamento ocidental porque foi por ele que os medievais tiveram os primeiros contatos com o pensamento e análises sobre o grego antigo, Aristóteles. Enquanto os europeus conheciam apenas Platão, via Santo Agostinho, os árabes, e no caso, Averrois, além de outros, já haviam estudado e escrito vários textos levando em conta o pensamento aristotélico. Entre a Espanha e o restante da Europa, os montes Pirineus são uma barreira natural que dificultava o acesso dos intelectuais das universidades de Paris, de Colônia e de Bolonha aos textos de Aristóteles; quando conseguiram com Averrois, perceberam outra barreira, tudo estava escrito em Árabe. Mesmo assim, com traduções esporádicas, foi-se, aos poucos, adentrando ao pensamento dos antigos. Nesse caso, é preciso dizer que Averrois foi o primeiro a relacionar a noção de "motor inicial" de Aristóteles com Deus, no caso Al-Lá e, assim, afirmava que é possível conhecer a verdade através da razão. Para ele, o homem foi feito por Deus, logo a razão foi feita por Deus e, se esse é onisciente, a razão humana pode conhecer todas as verdades. Para isso, basta saber usá-la adequadamente. Nesse caso, conhecer a verdade é, necessariamente, conhecer a vontade de Deus. E, ainda, com a razão é possível perceber a existência e a unicidade de Deus, assim como é possível se obter capacidade de objetar as interposições dos ateus. Mas, para isso, a capacidade de raciocínio é dividida em intelecto potencial e intelecto ativo: os humanos são dotados de intelecto potencialmente conhecedores, mas dependem em cada um a ação intelectiva. Por isso, essa ação intelectiva precisa ser mediada pela religião. Aliás, filosofia e religião precisam estar interligadas, já que procuram a verdade: se a verdade é Deus, ambas podem encontrá-la. É comum nas representações de Santo Tomás de Aquino, o maior intérprete de Aristóteles de todos os tempos, aparecer - em alguma parte - a figura de Averrois, já que foi esse o grande responsável por introduzir a filosofia aristotélico na Europa medieval e, conseqüentemente, no próprio Tomas de Aquino.

quarta-feira, 19 de abril de 2017

Idade Média, História e Complexidade

Para entender o pensamento moderno de todo o Ocidente é necessário antes entender aquilo que os europeus chamaram de medievo, o “meio da história”. No entanto, não deve fazer apenas referências simplórias ao período que segue após a Idade Antiga e que precede a Idade Moderna, mas se faz necessário entender os seus contornos, as suas implicações, as suas composições, a estrutura de poder, instituições, hierarquias e burocracias; além das correntes filosóficas que lhes foram próprias, o papel da Igreja, bem como as práticas jurídicas e políticas etc. Em primeiro lugar é preciso dizer que essas delimitações tal qual se estabelece é uma decisão arbitrária do continente europeu e que as demais sociedades não necessariamente se balizam por elas; em segundo, que todo o conhecimento que se tem da Idade Média é uma coleção de noções compiladas por historiadores modernos numa tentativa de entendimento sobre a época e o que se sabe são apenas projeções do homem moderno. Mas, caminhe-se por essas projeções! Sim, havia uma influência muito grande da Igreja, pelo menos é isso que se denota, quando se sabe da presença do pensamento do filósofo grego, Platão, via São Agostinho, estabelecendo um distanciamento entre o mundo terreno, da carne e do pecado, e o mundo celestial, da verdadeira justiça e do verdadeiro amor. Nesse caso, se a influência do clero era determinante para a vida intelectual, isso também se deve à força política herdada pela Igreja Católica como remanescente do Império Romano a se impor sobre os povos, ditos bárbaros. Dessa situação demanda ainda a catequização dos povos pagãos, a criação do tribunal do Santo Ofício (a Santa Inquisição), as cruzadas (uma seqüência de viagens para o Oriente que iniciaram como guerras religiosas em defesa da Terra Santa, mas que desembocou num lucrativo comércio, dando origem ao regime econômico capitalista). Aliás, as cruzadas dividiram a história do Ocidente em antes e depois, desembocando no que se chamou de modernidade. Certamente que nessa segunda metade é necessário fazer referencias à presença da filosofia de Aristóteles, agora - via São Tomás de Aquino, reestruturando o pensamento da época, passa a valorizar o corpo como tabernáculo de Deus. Enfim, por mais que se fale sobre o medievo, não se atinge por completo as evidências da estrutura social e cultural, rica e complexa, que foi. Enquanto isso, as pessoas permanecem a falar coisas acertadas ou errôneas a respeito desse período.

segunda-feira, 17 de abril de 2017

Corrupção: Uma Sociedade Doente

Já se disse que a corrupção, a quebra de alguma peça componente de um sistema, é algo inerente a qualquer estrutura organizacional; em outras palavras: corrupção sempre houve e sempre haverá. Mas se pensá-la como desvio de verba, como venda de favores, de influências ou de oportunidades, tudo fica muito complexo e necessita uma análise adequada; se for pensada dentro da criatividade brasileira fica ainda mais difícil de desvendar o funcionamento. Hoje, no Brasil, se fala de corrupção e se alterna entre propina e caixa dois; claro que quando se faz isso já se tomou um posicionamento em afirmar que uma coisa é sinônima da outra. Alguns jornalistas preservam os seus dizendo que tal indivíduo realizou caixa dois e, calcando contra adversários, dizem esses receberam propina. Sim, dependendo do anglo e se baseando na legislação, caixa dois é propina. No entanto, o que deve ser colocado no meio do debate é que receber contribuição de empresas para campanha eleitoral, e não contabilizá-las, é uma atitude institucionalizada por muitos anos na política brasileira. Institucionalizada porque todos sempre souberam: a imprensa, as universidades, os especialistas, o ministério público e o judiciário - aliás, esses dois últimos fiscalizaram (ou não) as campanhas e deram os devidos diplomas aos eleitos. Fica estranho a imprensa e o ministério público/judiciário se espantarem, como se nunca soubessem de nada, como se seus próprios setores nunca fossem acusados dos mesmos crimes (SILVA, Felipe Gonçalves org. Manual de Sociologia Jurídica - Saraiva, p272). É preciso combater a corrupção no País, mas sem hipocrisia. Perguntas: até hoje nenhuma igreja foi acusada de angariar dinheiro indevido dos seus fiéis? Nenhuma universidade desviou verbas das suas funções? Ninguém, até hoje, vendeu questões do ENEM ou do vestibular? Nenhum jornalista recebeu presentes, dinheiro vivo, ou viagens, para favorecer certas personalidades? Nenhum funcionário público vendeu favores? Ninguém mentiu para o Imposto de Renda, ou outro imposto qualquer? Nenhum empresário mentiu sobre a durabilidade ou qualidade de seus produtos? Toda falcatrua é mal vinda; mas têm que ser todas, mesmo aquelas que estão legalizadas, que são feitas porque os furos da Lei permitem. Os problemas de uma sociedade nunca são políticos, mas sempre culturais. É preciso que cada brasileiro olhe para dentro de si e veja suas próprias corrupções, suas ações que prejudicam o andamento da sociedade, mesmo que sejam legais: auxilio creche, auxílio moradia, auxílio paletó, bolsas para curso no exterior - mesmo não havendo exigência para o desempenho em tal setor e quando milhões de pessoas não têm esse privilégio. A corrupção dos políticos é uma minúscula parte de um todo social doente e que precisa se auto-analisar.

sexta-feira, 14 de abril de 2017

Em Busca da Felicidade

Uma preocupação insistente que tem atormentado filósofos, psicólogos, sociólogos, historiadores e antropólogos é o de saber que fenômeno move as pessoas em suas lutas pela existência. O que move o mundo? Se para alguns tudo gira em torno de um pensamento de re-ligação com o ser divino, ou de abandono das coisas materiais, em um busca constante de forças espirituais, para outros, o segredo está na força econômica e nas conseqüentes lutas entre de classes. Para Epicuro, um pensador grego da ilha de Samos, que viveu entre os anos 341 e 270 aC, o que move os homens nas suas lutas pela existência é a eterna busca pelo prazer, por um caminho que conduza sempre à felicidade. Era o hedonismo, um nome que se deu a essa corrente que pregava a constante busca pela felicidade. No entanto, a sua interpretação como aquilo que move a humanidade é visto com mal-olhos por muitos, como se fosse um ensinamento que prega o abandono ao regramento e que defenda a entrega aos prazeres de forma inconseqüente. Não. O hedonismo diz que, queiram ou não, as pessoas estão eternamente em busca da felicidade, em busca de prazer e, conseqüentemente, fugindo de infelicidade. Se buscam dinheiro pensam que esse objeto pode trazer-lhes felicidade, se procuram deuses, esperam que através deles possam ter neles a paz, esse prazer, e assim por diante. Pensam em viagens, compras, estudos etc., sempre entendendo que, com isso, podem encontrar a felicidade. Mas isso não deve ser entendido como algo terrível, pelo contrário, as pessoas devem mesmo viver uma eterna busca do prazer, da felicidade. Mas o que devem fazer é agirem com sabedoria para que esse prazer seja o mais profundo e duradouro possível; não pode acontecer a partir de algo que proporcione um prazer imediato e que vai desencadear um sofrimento em uma longa duração. Para Epicuro, todas as ações humanas são dirigidas na busca da própria felicidade sempre, mesmo quando se pensa em fazer uma boa-ação. Ou seja: a pessoa faz uma obra de caridade, crente que faz o bem para alguém, e até o faz, mas o motor principal, que o comanda, é a sua própria felicidade. Depois da ação feita a pessoa sente um regozijo, um forte prazer por ter realizado algo que acredita ser importante; ou seja: a pessoa fez algo em seu benefício, em busca de prazer.

quarta-feira, 12 de abril de 2017

Giordano Bruno, Catolicismo e Inquisição

Um tema que atrai bastante a atenção do publico em geral, mas ainda muito nebuloso, com pontos de vista que levam em conta posições filosóficas, políticas e teológicas, são os julgamentos realizados pela Sagrada Congregação Romana e Universal Inquisição do Santo Ofício, a Santa Inquisição. E, nessa nebulosa, encontra-se o monge dominicano Giordano Bruno, teólogo e filósofo italiano de Nápoles, nascido em 1548 e morto na fogueira em 1600, como resultado de uma condenação por prática de heresia. Como se sabe, os séculos XV e XVI foram marcados pela prepotência do clero católico, pelas inúmeras heresias ocorridas, pelo cisma da Igreja - com o surgimento do protestantismo e, consequentemente, pelo reestabelecimento da Santa Inquisição como forma de estancar a sangria sentida pelo pontificado romano. Nesse contexto, Bruno, o frade dominicano, se caracterizou como um sacerdote rebelde, influenciado pelas novas ideias da modernidade que questionavam as decisões tomadas pelo poder central do catolicismo romano. Num primeiro momento, sentiu-se influenciado pelo protestantismo calvinista, se afastando mais tarde quando percebeu o perigo que era, mas - mesmo assim - percorreu outras linhas teológicas desenvolvendo pensamentos em que põe Deus em todas as coisa da natureza, um panteísmo. Alem disso, Bruno questionou as posições da Igreja no que trata da deidade de Jesus, a virgindade de Maria, a transmigração da alma, a transubstanciação do pão a corpo de Deus e outros tantos dogmas, sempre tão caros para a tradição católica. Como filósofo consta como sendo um leitor e comentador de Aristoteles e do frade polonês, Nicolau Copérnico - o que afirma que a Terra não é o centro do sistema, mas o sol - de onde Bruno tira a ideia de uma infinitude para o mundo, um dos pontos heréticos, acusado pelo Santo Ofício. Segundo ele, o mundo é infinito porque Deus é infinito. E questiona no livro, A Ceia de Cinzas: "como acreditar que Deus , ser infinito, possa ter se limitado a si mesmo criando um mundo fechado e limitado?" Seus textos filosóficos não alcançaram tantas considerações para a posteridade como foram os seus enfrentamentos aos ensinamentos da Igreja e a firmeza de suas convicções frente ao tribunal da Inquisição. A ideia de um panteísmo não é sua exclusividade, pode ser encontrada em pensamentos orientais e mesmo na relação criatura/criador do pensamento cristão de deus-único (onisciente, onipresente, onipotente), ou no "motor inicial" de Aristoteles, mas foi Bento Espinosa, mais tarde, que formulou o pensamento, mais adequadamente.

segunda-feira, 10 de abril de 2017

A Justiça em Aristóteles

Diferente de Platão, seu mestre, Aristóteles da Macedônia pensou em um mundo, apenas, onde estão todas as coisas, suas particularidades e conceitos enquanto universais. Se para o mestre da teoria dos dois mundos, a verdadeira justiça está no mundo das ideias, já que no mundo sensível estão apenas cópias imperfeitas, para o macedônio a justiça, na sua totalidade e plenitude, pode ser vivida neste mesmo é único mundo. Para Aristóteles, o que precisa é pensar a justiça, entendê-la e praticá-la. No livro, Ética a Nicômaco, ele mostra que é preciso fazer uma ligação direta com o entendimento de sociedade e sua política, além de ser necessário levar em conta o conceito de equidade. Assim, o macedônio mostra o conceito de justiça nas suas variedades, como total e particular, como político e doméstico ou como distributivo e corretivo. Alguns comentadores dizem que seu pai se chamava Nicômaco e que ele teria dado o mesmo nome ao filho; nesse caso, o livro intitulado, Ética a Nicômaco, tanto poderiam ser os ensinamentos recebidos do pai quanto poderia ser os ensinamentos a serem passados ao filho. De qualquer forma as suas noções de política, justiça, virtude, ética e equidade foram uma grande contribuição deixada para a posteridade. Aristóteles mostrou que o indivíduo, nos percalços encontrados pelo caminho, precisa atingir o meio termo, já que é na temperança, no equilíbrio, que se encontra a virtude e, nos excessos, o vício. No entanto, quando se trata de justiça, o excesso nunca será vício, pois quanto mais justo for o individuo, mais virtuoso será. O interessante é que no século 4 aC ele já percebia que não haverá justiça se não se observar a distribuição entre as pessoas, o que Karl Marx enfatizaria mais de dois mil anos depois; para ele, é preciso pensar a justiça também como distributiva. Equidade é um conceito fundamental para o direito e qualquer iniciado nas ciências jurídicas é capaz de perceber isso, mas foi Aristóteles quem primeiro chamou a atenção afirmando que a pretensão de uma igualdade absoluta pode mesmo é levar a uma injustiça. É quando ele faz a afirmação famosa: “tratar os igualmente os iguais de desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdade”. Mas para que haja a justiça é preciso que haja também a amizade (philía), não um tipo de bem querer, geralmente encontrado em pequenos grupos de relacionamentos, mas um tipo de relacionamento integrador de todas as partes da sociedade, um pensamento comum.

sexta-feira, 7 de abril de 2017

Fracasso Brasileiro: Televisão e Falta de Leitura

Os três poderes completamente viciados. De um lado parlamentares eleitos e reeleitos há mais de décadas, alguns com denúncias fortes contra si ou contra familiares, de outro, presidente, governadores e prefeitos atrelados a grandes estruturas econômicas e, ainda do outro lado do triangulo, magistrados denunciados de parcialidade e de agirem politicamente, na defesa de certas ideologias. Isso sem contar que com uma burocracia ilógica e, por vezes, corrupta. Inerte, uma população assiste e vive com críticas às atividades políticas como se essa fosse causadora de todos os descasos e, os conseqüentes transtornos vividos pela população: a decadência no sistema de saúde, na educação, na segurança, além de vários outros tópicos continua. E como resultado: atônitos, membros da sociedade, com um pouco de instrução, se perguntam uns aos outros, o que acontece com a população brasileira que vive continuamente um vai-não-vai, um “sobe-e-desce”? O que acontece com esse País que demonstra tanta dificuldade para resolver os seus conflitos mais fortes, em um vasto território com riquezas naturais tão importantes para serem exploradas em séculos? Primeiro é preciso entender que os problemas não são políticos, mas cultural e toda análise precisa partir dessa premissa; ou seja: os problemas políticos são o resultado de uma maneira de ver e de agir no mundo. Mas aí surgem outras perguntas: que pensamento é esse que produz um estado patriarcal, corrupto, caro e lento? Em que forja esse pensamento social e político foi produzido? Acontece que há cem anos o brasileiro era um povo, na sua maioria, camponês, iletrado, que fora arrancado do campo e jogado nas cidades para servir de mão de obra nas indústrias que surgiam com promessas de grandezas. Esse povo todo, nas cidades, não encontrou o incentivo necessário para educação, ou para ser iniciado nas leituras, mas no seu lugar recebeu, com força, a presença dos canais de televisão com uma programação adestradora. É o resultado que se tem nos tempos atuais: um povo que não lê, mas que perde muitas horas diárias diante da televisão. Se por um lado o povo não lê mais que um ou dois parágrafos, por outro está à mercê dos ricos proprietários de canais de televisão a passarem suas ideologias através de novelas, de jornais e programas vespertinos ou dominicais. Solução? Talvez haja se o povo parar de ver televisão por um tempo e passar a ler. Ler muito.

quarta-feira, 5 de abril de 2017

Urbanidade e Selvageria

O que marcou o início das civilizações foram os surgimentos dos primeiros assentamentos nas margens dos rios e a formação dos núcleos urbanos: as primeiras cidades. A partir daí tem-se a descoberta do metal, o surgimento da escrita, da moeda e, conseqüentemente, do comércio, o que possibilitou as relações entre as cidades, os conflitos, as invasões e as trocas de experiências. Ao longo dos tempos, os aglomerados urbanos, foram aumentando continuamente com as levas de agricultores que, cada vez mais, deixavam seus afazeres rurais para exercerem funções de artesãos e de soldados nas cidades e vilarejos; raramente chegavam a ocupar cargos públicos ou profissões liberais. O surgimento dos grandes núcleos populacionais mudou por completo os aspectos gerais da vida humana, agora regrada - nos primeiros tempos por um pensamento teocrático – mas, ao passar dos séculos - por uma legitimidade racionalista. Aliás, racionalidade cada vez mais necessária para manter a organicidade desses aglomerados, de pessoas vivendo tão próximas, com funções tão diversas, com necessidades tão básicas, como o saneamento, por exemplo; o que levou ao surgimento de inúmeras e estranhas doenças. Somente no final do Império Romano, no século V e VI, que famílias abastadas deixaram as cidades para se fixarem nos campos e se fecharem em castelos com seus servos, fora disso o movimento tem sido sempre do campo para os núcleos urbanos que crescem continuamente ao longo da história. As maiores cidades da atualidade possuem populações contadas aos milhões e isso aumentou aos seus governantes preocupações inevitáveis como a mobilidade, a segurança, o lazer, a educação, a saúde etc. Esses grandes aglomerados acabaram dando origem aos subgrupos humanos formados por profissionais de certas áreas, por moradores de condomínios fechados, de bairros ou vilas, por freqüentadores de grandes clubes de lazer da sociedade, bem como dos excluídos dos grandes grupos. Nos grandes debates a urbanidade sempre foi proposta como um contraponto à selvageria, pensando a vida selvagem como a ausência de normas, de uma eterna guerra de todos contra todos. No entanto, foi no seio das grandes cidades que se formaram as chamadas guerras urbanas, travadas entre grupos de traficantes, ou de salteadores, e entre esses e as forças do estado. A urbanidade, pensada como elevação humana, de regramento, como um grande contrato que um dia se firmou, começa a mostrar que a vida digna talvez seja mesmo aquilo o que em um momento se chamou de selvageria.

segunda-feira, 3 de abril de 2017

Relações de Amizade

As amizades já foram cantadas em versos e prosas, muitos idiomas aprofundam a conceituação, alguns dicionaristas aproximaram mais da noção de amor, outros ficaram apenas como uma espécie de afeição e, ainda outros, como uma estima. No entanto, todos os poetas, dicionaristas, psicólogos, sociólogos e filósofos são unânimes em expressar a necessidade do amigo ao longo de toda uma existência humana. Esse é um daqueles tipos de relações humanas que se fundamenta em si mesmo; ou seja: a amizade é um tipo de aproximação em que os dois possuem um pelo outro um sentimento de bem-querer sem qualquer pretensão ou interesse de retorno. Uma relação muito comum entre pessoas do mesmo gênero, da mesma orientação sexual e de mesma idade, mas não necessariamente; muitas pessoas se aproximam umas das outras mesmo que suas visões de mundo sejam bastante diferentes; se aproximam porque se completam. Quando a amizade existe de fato, ela acontece como uma via de mão dupla, de modo que os dois se doam, com cuidados e até com uma dose de cumplicidade; nesse caso, a aproximação permanece e se amplia. Algumas amizades existem para toda a vida, pois quando um morre, a memória continua viva na mente do outro. No entanto, quando acontece como uma via de mão única, quando um dos dois se revela apenas como parte interesseira, fatalmente, em algum momento, a relação desmorona como um castelo de cartas. Pior que isso, aquilo que outrora fora um sentimento de bem-querer, de parceria e de cumplicidade, tornara-se um sentimento de traição e de abandono. Acontece que os humanos necessitam de ancoradouros, de portos seguros que lhe dêem proteção – se não proteção física, mas psíquica, algum apoio que lhe dê sustentação. Quando a relação de amizade é corrompida por atitude que os desconecte, um dos lados se sente lesado, se frustra e se afasta. No entanto, se as amizades são indispensáveis para a existência humana, as pessoas das amizades não são, necessariamente, indispensáveis; isso porque sempre novos amigos podem e devem surgir na caminhada. E, com a chegada de novos amigos, haverá sempre mais crescimento: novas conversas, novas interpretações do mundo, novas noções de política e de sociedade.