quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

Fascismo, Ontem e Hoje

Para ser simplista, pôde-se afirmar  que, muito diferente do liberalismo e do socialismo, o fascismo foi uma corrente política calcada na defesa extrema de uma dada cultura, de princípios,  de um idioma e costumes próprios. Simplista porque além dessas afirmações precisa se levar em conta o estado forte a impor vontades de um governante - ou de uma dada elite que o cerca - interferindo nas mais variadas instituições da sociedade.
Mas, para além do totalitarismo e do autoritarismo próprio do regime, talvez a essência do pensamento fascista esteja no seu próprio nome, na sua origem e no símbolo escolhido para representá-lo pelo italiano Benito Mussolini, na década de 1910. Tudo começou ainda no final do século 19, quando grupos paramilitares se auto-intitulavam fascistas e, na defesa de políticas que enaltecessem as causas nacionais, chegaram ao extremo em confrontos com imigrantes, com socialistas e liberais.
O termo remonta os antigos etruscos e depois, difundido no império romano, e vem do termo latino fasches - um feixe de varas podadas em um só tamanho, amarradas juntamente com um machado. Durante o império romano, certas autoridades eram precedidas por funcionários públicos que carregavam esse feixe de varas amarradas como símbolo de unidade: a ideia é de que uma vara pode ser quebradas, duas talvez, mas nunca um feixe muito grande.
Como os conceitos se alteram com o tempo, mudando pouco ou nada a sua essência, entretanto - em geral - com uso diferente, e assim foi o caso de fascismo. Não há hoje um governo que se auto-intitule fascista como modo ser, mas a palavra migrou para o dia a dia das pessoas, usada para a atitudes mandona, perversas e de exclusão. Se nos anos 20, 30, 40 e até 50 havia simpatia pelo regime e pessoas facilmente se auto-intitulavam fascistas, a partir dessas datas o termo cambou para um sentido pejorativo e não se encontra hoje mais alguém que aceite ser chamado como tal. Da mesma forma, os governos fascistas continuaram a existir e até os dias de hoje é possível se enquadrar certos regimes dessa forma, mas o termo - enquanto designação oficial de um governo - deixou de existir.
Nos tempos atuais se usa muito a palavra para designar atitudes de prepotência e exclusão de pessoas diferentes: quer seja de ordem racial, género, orientação sexual, faixa etária etc. Assim como determinadas corporações que se fecham em copa com o intuito de satisfazer apenas as suas próprias necessidades, ainda que isso aconteça em detrimento das necessidades dos outros.
Mesmo que os governos não sejam mais oficialmente fascistas e que se note um uso mais direcionado para pessoas em particular, se percebe uma ligação direta entre as pessoas aquém chamamos com esse adjetivo e os governos fascistas de outrora. Isso significa que as pessoas, a quem hoje identificamos como fascistas, prepotentes, mandonas, racistas, sexistas e homofóbicas, se estivessem a frente de um país seriam governantes fascistas nas mesmas condições do que existiam nas décadas de 20, 30, 40 e 50 do século 20.

terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Os Sabers e os Males

Um engano paira sobre as análises que comumente se fazem sobre a vivência humana e os seus saberes. Para alguns, todos os males que perseguem a população advém do excesso de saberes acumulados durante todos esses tempos de civilização e, para outros, ao contrário, é a falta desses saberes que acarretam todos os dissabores humanos. Nem ao céu, nem a inferno, cremos que essa questão está envolvida em uma maior complexidade do que aquilo que aparenta: não é o excesso desses conhecimentos que acarretam os males, tão pouco as suas ausências totais.
Ora, os problemas humanos não advém dos saberes acumulados nesses seis milênios de civilização, assim como os não saberes, mas o não saber acompanhado de um pensar que sabe; ou, do outro lado, um não saber que não sabe. Acontece que o fogo, a roda, a máquina a vapor, a energia nuclear, os computadores e todas as invenções e descobertas são hoje conhecimentos usados dependendo - ou não - de outros saberes de ordem ética, política, econômica e social, necessários para o entendimento da totalidade humana.
Aí reside a complexidade: os saberes acumulados edificaram os homens e aqueles que os detiveram são hoje as pessoas que conseguem ver o mundo na sua totalidade e percebem as franjas do real. Já aqueles que não sabem, ou que ignoram tais saberes, reservam-se ao seu mundo e não acrescentam maldades aos seus iguais.
O perigo que a humanidade enfrenta são esses saberes simplificados, saberes diminuídos pela preguiça, com o propósito de facilitar as compressões, as notas de rodapé, as citações das citações, as frases na mídia social, tudo isso criam na mente uma ilusão de domínio do conhecimento e a pessoa não sabe sobre algo, mas não sabe que não sabe, e se aventura a debater. E assim será dirigido o seu destino e, consequentemente, o destino daqueles que fazem parte da mesma sociedade já que todos estão interligados.
Os hiatos, a falta de um começo, bem como de um fim, distanciam qualquer pretenção de um esclarecimento satisfatório. Aquele que não sabe que não sabe é o que sabe pouco; sabe de forma destorcida. É o que sabe que tal coisa existe, mas seus conhecimentos ficam no senso comum, não são suficientes para perceber o quanto ainda lhe falta para ter uma noção de totalidade. Foi encima disso que Sócrates admitia "só sei que nada sei" ou que Jesus de Nazaré ao ensinar que "para entrar no reino de Deus é preciso nascer de novo".

sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

Capitalismo, Um Regime Sem Teoria

Existem teorias econômicas, teorias sociais e políticas, mas não se pode dizer que alguma delas é uma teoria específica do capitalismo, algo que se possa pensar como teoria geral, que se possa chamar de um pensamento geral desse sistema econômico. Não existe porque o capitalismo não se assenta sobre uma estrutura lógica, com partes integradas, coerentes, mas em um conjunto de vontades que por sua vez pertencem a indivíduos com todas as suas cargas de subjetividade; portanto, frutos de fatores que vão das suas condições biológicas, às econômicas, psíquicas e sociais.
O que alguns economistas, cientistas políticos e sociólogos têm feito é juntarem migalhas de pontos soltos do regime baseado no capital e tentarem unir esses pontos em um grande "Frankstein". Alguns fazem isso numa tentativa de legitimar interesses de classes e, outros, para denunciar que tais interesses são provenientes das relações produzidas pelo regime.
E mesmo que liberais unam suas vozes em ode ao mercado e louvores ao estado mínimo, não estão dando ao regime econômico um nexo, uma teoria geral que explicite a dinâmica de suas entranhas. O que têm feito são apologias ao regime e enaltecimento ao estado mínimo como forma de liberar a economia privada do peso dos impostos e favorecer interesses de alguns indivíduos que querem incorporar o que for patrimônio público.
Os que chegaram mais próximo de uma teoria do capitalismo foram Adam Smith e Karl Marx. Enquanto Smith assegurou que o mercado não deveria ser freado pelo estado e que a origem da riqueza do homem e do poder está no trabalho e não no metalismo medieval, Marx seguiu seu pensamento, mas acrescentou que se na origem do trabalho está a riqueza da sociedade, então são os trabalhadores que devem assumir o controle político. No entanto, mesmo os dois tendo dedicado suas vidas em escarafunchar o regime nenhum dos dois o teorizou. Muito pelo contrário, cada um - à sua maneira - falou de um mundo bom, com fartura e até de igualdade. Enquanto um afirmou que isso só poderia acontecer pela economia de mercado, o outro acusou-a de provocar a dominação de uma classe sobre a outra.
Acontece que o capitalismo é essencialmente selvagem, não tem porta, não tem bandeira, não tem princípios, não tem moral, corre solto sem amarras. Ele está para a modernidade e se utiliza de todo o pensamento racional burocrático moderno, se utiliza da ciência do Direito e da Administração de Empresa, mas está calcado nas entranhas egoístas da paixões selvagens da humanidade. Ele subsiste de maneira incrustada nas mentes concorrenciais desses tempos, de disputas de todos contra todos, no egoísmo e na desconfiança geral.

quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

Tudo Muda, o Tempo Todo

As coisas mudam sempre. Mudam, mas as pessoas não se dão conta dessas mudanças e, por isso, não conhecem a essência dos objetos aos quais discutem. Os conceitos, as ideologias, as crenças, as instituições, em maior ou menor proporção, estão mudando a todo instante. Aliás, há uma relação muito próxima não só entre esses dois conceitos, mas também entre seus objetos: a existência e a mudança.
O estar no mundo, o existir, só ocorre a partir de um surgimento, de uma entrada e uma saída, portanto, transforma-se para surgir e, no surgimento, segue caminho para o fim em uma constância de mudanças. Dessa forma, o existir é também um mudar.
Se nos tempos passados as mulheres, na sua maioria, ficavam alheias aos trabalhos executados fora do espaço doméstico, com o advento das novas tecnologias excluíram-se as necessidades da força física e elas entraram de vez no mercado de trabalho. Hoje as mulheres mudaram e estão a executar as mais diferentes atividades outrora executadas apenas por homens.
O mesmo tem ocorrido com os pensamentos políticos e econômicos e o estabelecimento das novas noções de poder. Como resquício da Idade Média, e até bem pouco tempo, ou mesmo nos dias atuais, se pensavam (alguns ainda pensam) que as vastas extensões de terra detinham a origem da riqueza e do poder.
Resquício da Idade Média porque nesse período a nobreza era medida pela quantidade de terras que possuía, assim como a economia metalista, em que os reis eram medidos pela quantidade de pedras e metais preciosos que acumulavam em suas câmaras de tesouro. Mas, como tudo muda, as mulheres hoje executam trabalhos outrora unicamente de homens e não se pensa mais em riqueza, ou poder, a partir de acúmulo de pedras ou metais preciosos.
Da mesma forma não se pode mais legitimar a existência de um país - um território e seu povo organizado politicamente - com uma vasta extensão de terras, ou uma grande população. Se um dia isso foi necessário para legitimar imperadores como Julio César, Alexandre e Dário, isso mudou. Hoje é possível um país de somente uma cidade ter uma população satisfeita e feliz.
Esse texto, por exemplo, um dia não existiu e agora existe, em um momento não fora lido e agora foi; outros um dia existirão, poderão ser lidos e, quem sabe, um dia esquecidos. Por isso as lutas dos conservadores por não aceitarem as mudanças são em vão, pois mesmo as suas lutas mudam, assim como o objeto de suas lutas mudam também.

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Da Hipocrisia

Naturalmente não existem santos ou demônios entre os humanos: o que existe são pessoas comuns a se equilibrarem entre ações viciosas e ações virtuosas; algumas pendendo mais para um lado enquanto outras mais para o outro. Em se falando desse tema, primeiro é preciso que se diga, nesse caso os conceitos obedecem as premissas aristotélicas: de um lado os vícios são as atitudes que o próprio agente, como ignorante que é, não tem o controle e, do outro, as virtudes são atitudes em que se praticam conscientemente as ações e, por isso, se tem o controle.
Ora, mas se todos têm vícios e virtudes e alguns indivíduos pendem mais para um lado enquanto outros para outro lado, pôde-se dizer que a atitude mais maléfica, possivelmente a mais perversa das condições humanas seja o vício da hipocrisia. E isso se deve por uma justificativa forte, o agente não consegue medir a extensão e efeito das suas ações. Ou seja: o hipócrita não consegue medir o quanto pode ingerir negativamente naquele que é a vítima de tal atitude.
Mas para que se tenha uma atitude hipócrita terá que acontecer um conjunto de fatores: primeiramente as condições patológicas do agente, depois, uma estrutura psíquica de passionalidade, em seguida, a ignorância sobre o que está posto, assim como uma vontade própria do indivíduo diante do fato. E o interessante é que isso se dá de forma tal que aquele que pratica acaba por não ter noção clara de que a sua atitude tal fora hipócrita e maléfica socialmente.
A palavra hipocrisia é uma transcrição direta do vocábulo Grego ypokritís e o conceito que tem sido aceito diz que é a atitude de pretensão ou de fingimento de alguém diante de uma situação, ou um querer ser o que não é. Conta-se que os atores gregos usavam máscaras de acordo com a personagem que representavam em uma peça teatral e que, daí, teria surgido o termo designando alguém que oculta o que é real, a realidade atrás de uma máscara de aparência.
Mas o que se quer dizer com isso é que ninguém é santo ou demônio. Todos os humanos, dotados de alguma racionalidade, dirigem suas vidas e cometem os deslizes em ações benéficas e maléficas, virtuosas e viciosas. Acontece que alguns agem com uma vontade dirigida por preocupação com a ordem social, preocupação com o outro. Com erros sim, vícios, mas não hipocritamente.

sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Da Tortura

Historicamente as pessoas espancaram umas às outras pelos motivos mais variados: por vingança contra um determinado ato errado do outro, para impor suas vontades, para roubar-lhes algo, ou por representar o estado e se ver no direito de agredir o corpo do outro. Na antiguidade podiam cortar parte do corpo daqueles que infringissem as leis postas pelos governantes ou serem mortas simplesmente; enquanto nos tempos do medievo isso não foi tão diferente, a não que ser os suplícios - na sua maioria - ocorriam por motivos religiosos e, na modernidade, a isso somou-se a pena do degredo, o desterro, ou abandono.
Se todas essas formas de sofrimento, impostas sobre o corpo do outro, podem ser reunidas em um conceito, o de tortura, então pode-se dizer que essa surge quando a racionalidade percebe as contrariedades nas suas ações e não as aceita. Nos tempos atuais, mesmo depois de ser proibida pela Terceira Convenção de Genebra (1929), ratificada depois pela Organização das Nações Unidas, a tortura continua a ser praticada em diversos países como algo natural.
Mas a racionalidade dos tempos atuais não permite que se aceite qualquer forma de suplício como modo de reparar um dano, ou como pena que se pense com isso conferir justiça. Mesmo assim é possível que se encontre atitudes dessa natureza: particulares se juntam para linchamentos daqueles que cometeram, ou se pensa que cometeram, determinados atos não aceitos pelo grupo.
Acontece que a tortura, mesmo constituindo uma grave violação dos Direitos Humanos, não aceita por qualquer convenção internacional e repudiada por estudiosos das humanidades, ainda é praticada pelo mundo a fora. Mas o estranho é que, assim como linchadores populares, desinformados, incultos, também funcionários públicos, burocratas lotados em órgãos de segurança, se acham no direito de suprimirem a Lei e aplicam as suas vontades particulares, os "corretivos" que acreditam serem os adequados.
E nesse rol encontram-se alguns - que a ressalva seja feita - policiais militares, civis, federais, carcereiros etc., que nesse ato se acham no direito de maltrataram o corpo do outro; e, mesmo que eles não saibam, esse é também um ato de subversão à Lei. Ora, se de um lado alguém é chamado de marginal porque não respeita as leis, do doutro, o torturador também é alguém que desrespeita as lei, um fora-da-lei, se nenhuma lei manda que se supliciem o corpo do outro.

quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

O Livre-arbítrio, o Pecado e a Culpa

Ja se falou muito sobre a ideia de vontades e de liberdades individuais; para alguns o livre-arbítrio é algo real, indiscutível, inerente à alma humana e, para outros, uma ilusão construída historicamente, com a função de determinar o controle entre as pessoas. Aliás, os conflitos que os humanos vivenciaram ao longo dos tempos não foram por outra coisa senão o encadeamento de fatos oriundos da ganância e da miséria sim, mas antes disso alimentados pelas noções de pecado ou de culpa como forças originais.
Marx e Freud (para ficar em apenas dois pensadores) se debruçaram sobre o tema para mostrar que, além das vontades imediatas, acreditadas como frutos da total liberdade vivida pela racionalidade humana. De um lado o conceito de ideologia e de superestrutura, um conjunto de ideias articuladas e coerentes entre si, mas que não refletem a realidade e, de outro, o inconsciente, um conjunto de pontos fortes incrustados na pessoa ainda nos seus primeiros anos de vida.
O pensador do Materialismo Histórico mostrou que, para além da produção material e pelo trabalho nessa produção material, as pessoas acabam por  construírem concepções de mundo que darão as regras dos seus "quereres", construindo suas necessidades e vontades. Por outro lado, o criador da Psicanálise mostrou que além da consciência - esse estágio controlável da mente a determinar os destinos, há ainda um inconsciente, um fenômeno inerente a consciência, mas que se oculta e dá ordens determinante às pessoas.
O que nem o materialista e nem o psicanalista perceberam é que, às suas contribuições contra o livre-arbítrio, outros pontos podem se somar: as forças biológicas e as determinações institucionais como igreja, escolas, famílias etc. De modo que a vontade que se quer livre torna-se tomada por influências biológicas, sociais, políticas, econômicas, ideológicas e um leque imenso de outras interferências.
O que se percebe é que o pensamento que considera as liberdades individuais existe para que então exista a ideia de culpa e de pecado, portanto,  a possibilidade de controle de uma classe sobre a outra com a imposição de leis, de princípios e costumes. Ora, não havendo culpa ou pecado também não haverá perdão, muito menos acusação ou defesa, não tendo assim como existir os julgamentos e mesmo as punições.

segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

Direito e Sofismas

Como um efeito cascata, pôde-se dizer que não haverá sociedade sadia se não houver instituições seguras, mas também que não haverá instituições seguras se não houver um mundo jurídico com pessoas habilitadas em condições de respeito e capaz de relacionar conhecimentos do Direito, da Política, da Economia com o mundo vigente.Acontece que o direito, enquanto conjunto de leis, só existe como resultado das ações políticas do parlamento em uma sociedade democráticatica, assim como a política surge das lutas pela a administração dos rendimentos das pessoas.
Falo desse modo para mostrar que uma coisa depende da outra e que, portanto, é preciso estuda-las separadamente, mas relaciona-las entre si para entende-las enquanto encadeamento dos fenômenos. Esses objetos todos, citados aqui, não existem em sim, a não ser enquanto conceito, mas o que de fato existem são as pessoas de carne e osso a se relacionarem em acordos e desacordos.
Acontece que o direito brasileiro historicamente se distância daquele praticado em sociedades do velho mundo, países com economias estáveis, com instituições fortes, e seculares, dentro do que se chamaria de "um direito moderno". O direito consuetudinário surge da história do próprio povo com seus costumes, suas crenças e necessidades, não de frágeis interpretações e cópias colonialistas.
Mas o direito brasileiro, como herança portuguesa, distancia-se disso ao buscar um direito romano, calcado na retórica sofística, do convencimento de juristas para juristas e - nesse caso em particular - mais preocupados com a projeção e os vencimentos do que com a justiça propriamente. Mais por falta de entendimento que por linha metrológica, juízes e procuradores da justiça se arvoram a fazer aquilo que é de poderes alheios, defendem seus interesses e se tornam burocratas a  emperrarem o sistema.
E isso ocorre porque, além da herança lusa, cada vez mais se formam em cursos de Direito homens e mulheres que pouco ou nada sabem sobre política, economia ou cultura; o resultado - em uma sociedade que a competição é a tônica da vida - são os argumentos sofísticos, estéreis e uma burocracia impossibilitada de fazer justiça. Certamente que os erros de uma sociedade não deve ser creditado apenas ao mundo jurídico, mas não há dúvida de que esse é um setor vital e que o seu  enfraquecimento leva a decadência de todo o sistema posto.

sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

Em Defesa da Direita

Pode parecer estranho, mas nos tempos de hoje se faz necessário a defesa da posição política de direita, não pelo seu valor em si, não pela sua política conservadora, liberal ou mesmo fascista, mas para que se faça o contrapeso com a esquerda e para que se erradique a nulidade ignorante que contraria posições sem saber o que está fazendo. A filosofia política de direita tem seu nexo determinado e coerente com defesa de ideais de mundo melhor, ou mais livre, seja lá o que se entende por mundo melhor, ou mundo  mais livre.
É preciso que se diga isso para contrapor as pretensas teorias políticas, sociológicas e econômicas "de direita" de um cem número de pessoas que fazem afirmações desconexas, sem qualquer elaboração, sem qualquer rigor metódico. Um puro "eu acho". Esses indivíduos parecem compor exércitos de inúmeros Don Quixote de La Mancha, seguidos de seus Sancho Pança a lançarem suas espadas sobre moinhos fantasmagóricos, ou ratos a seguirem os seus flautistas de Hamelin.
Ora, ninguém pode questionar o prestígio alcançado pela contribuição do pensamento de Adam Smith, um liberal indispensável para entender a produção da riqueza humana; aliás, foi lendo seus textos que Marx percebeu que a produção de riquezas está no trabalho. Da mesma forma são inquestionáveis as contribuições de contemporâneos como Milton Friedman, um Raymond Aron, ou René Remond, economistas, historiadores e cientistas políticos, entre tantos outros, mais ou menos liberais, mais ou menos conservadores.
Mesmo no Brasil. Alguns prestigiados intelectuais como Gilberto Freyre, Miguel Reale, Delfim Neto, sociólogo, filósofo e economista, entre outros, são pensadores que nunca estiveram próximos de qualquer pensamento revolucionário, mas que suas leituras contribuem para o entendimento da sociedade brasileira. A leitura de seus textos dá bases de compreensão política e social para que se saia da roda viva das elaborações de conjecturas econômicas e políticas soltas, desconexas, sem sentido.
Discutir política é discutir pensamentos de direita e de esquerda, de centro ou de extrema, como se queira elaborar e se enquadrar posições, mas ideias precisam ter norte, um nexo que possa receber uma contraposição. Enquadrar um pensamento qualquer como de direita pelo simples fato de o seu portador não entender o que o outro está falando é algo que não se faz, ou alguém dizer que não aceita tais e tais ideias, claramente despido de qualquer leitura a respeito, não deve ser levado em conta. Esse é o ignorante e o ignorante não deve ser considerado.

quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

Mercado e Ostentação

Nesses tempos de economia de mercado as relações sociais são dirigidas pela concorrência a todo o custo e, dessa forma, se deterioram na incompreensão, na mentira, na hostilidade, no individualismo etc. Com isso a humanidade é que se deteriora tendo em vista que o conceito que a define está calcado na relação de construção, embasado em outros conceitos como apoio, camaradagem, sinceridade, parceira e essas coisas.
Acontece que, com a luta pela acumulação de riqueza, as pessoas se entregam na busca pelo status da posse, pela simples demonstração de que possuem algo. Pura ostentação. Portanto, o pensamento dominante é que todos precisam consumir tudo, sempre, cada elemento novo posto no mercado.
E aí, surjem dois fenômenos ligados diretamente a essa necessidade de consumo que precisam ser considerados, a propaganda e o marketing; que não são levados isoladamente, mas juntos ou enleados com a comunicação e com aquilo que se poderia chamar de arte. Se o primeiro se preocupa em divulgar o surgimento de um novo artigo posto à venda, o outro, se orienta em fazer as pessoas sentirem-no como uma necessidade imprescindível.
E isso é feito de forma tão cientificamente bem tramado, depois de tão bem pesquisada essa mesma sociedade, que acaba penetrando nos mais variados setores sociais como a escola, a família, a igreja, o clube etc. Essa força toma conta das pessoas de maneira que essas se unificam em uma massa consumidora voraz e, caso não alcancem a obtenção do objeto posto na gôndola, se sentem inferiorizadas e, por isso, sucetíveis a ações desonestas.
As mentiras e as falsificações, mazelas dos tempos modernos, passam necessariamente por essas considerações; por extensão: a corrupção e o aumento da criminalidade nos grandes centros urbanos. Se a necessidade de consumo está posta, e o status vem da demonstração de que se tem posses, as pessoas não encontram outro caminho se não a se apresentarem como as que se "deram bem na vida", as que são possuidoras de riquezas.
As relações sociais se alteram com a história e em todos os tempos as mazelas são inevitáveis, em uma época foram as lutas por honras, em outras para serem vistas como depositárias da fé, mas nesses tempos em que o nexo é a acumulação de riquezas, a situação trás junto um desmonte da ossatura social. Que se tenha falsidades e enganações, todas as sociedades têm, ou tiveram, mas nenhuma pode estar assentada sobre algo que que não aglutine seus membros.

segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

Mercado e Repetição: o Fim da Arte?

Que o mercado interfere diretamente nas manifestações artísticas e culturais de qualquer sociedade muita gente já falou. O pensador alemão do século 19, Karl Marx, já cunhara conceitos como infraestrutura e superestrutura para dizer que as relações econômicas na produção de riquezas interferem diretamente na produção cultural de um povo e não o seu contrário, como se poderia pensar.
Mas as interferências diretas na produção artística quem mais falaram foram os pensadores da chamada Escola de Frankfurt, ao afirmarem a existência - já nas primeiras décadas do século 20 - de uma indústria cultural. Ou seja: a arte passou a ser produzida nos mesmos moldes de quem produz qualquer outro objeto a ser posto no mercado, sapatos, parafusos, automóveis etc.
A relação com o mercado é clara: para vender mais, e aumentar os lucros, é necessário concorrer com o outro e observar o que ele está fazendo de diferente e que lhe trás algum retorno, para assim fazer também e ganhar o mesmo ou mais. No entanto quando isso se faz com a arte e se copiam as tendências, aquilo que se está vendendo perde a própria essência que é a espontaneidade, a possibilidade de deixar a porta da alma aberta e assim expressar toda a subjetividade humana.
Aos mesmo tempo que se louva o diferente, que se quer novas ideias - até porque o capitalismo necessita das inovações - mais as pessoas caem nas repetições ao fazerem cópias de tudo aquilo que foi aceito pelo mercado. E o resultado são as grandes produções cinematográficas e musicais cada vez mais iguais umas às outras; quem ouve uma dada música, ou assiste determinado filmes, ouve a todas e assiste a todos.
Seriam essas mudanças uma decadência, ou mesmo a extinção da arte que junto com a filosofia, desde o começo da humanidade fora uma das manifestações humanas mais elevadas? Seria o fim de uma era e o início de uma racionalidade puramente instrumental em que o "saber fazer" toma conta e perde o sentido do "por que fazer"?
Adorno e Horkheimer escreveram em A Dialética do Esclarecimento anotaram que os tempos modernos caíram numa pretensa racionalidade, mas que a fazerem isso entraram em uma mecanização e a práticas irracionais. O que se depreende de tudo isso é que a economia altera a tudo e a todos e só uma vanguarda política, um jardim de Epicuro, para pensar diferente e lutar contra as convenções.

sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

A Política e as Confusões de Conceitos

Uma confusão de conceitos toma conta dos debates políticos recentes mais comuns, de modo que se confundem comunismo com nacionalismo, fascismo com socialismo e/ou capitalismo com liberalismo e assim por diante. E essa confusão leva aos debates errôneos, a acusações completamente injustas e prejudiciais para a construção de uma sociedade autônoma, além de levar a tomadas de decisões que contrariam os próprios interesses de cada cidadão.
A palavra comunismo foi tirada dos sistemas de comunas em que grupos de pessoas geravam suas riquezas e as trocavam entre si, vivendo sob uma auto-gestão política e administrativa independentes de um estado central. Exemplos de comunas se tem a de Paris em meados do século 19, das colônias germânicas de Santa Catarina, ou as vilas formadas no oeste estadunidense. É daí também que vem o conceito de comunidade, todos os membros da sociedade em uma de vida comum.
O nacionalismo, por sua vez, trás uma maior complexidade porque tanto pode existir como defesa dos interesses nacionais simplesmente, quanto pode entrar em uma exclusão ao estrangeiro, o que se chamaria, xenofobia. Nesse segundo caso, o nacionalismo está mais para o fascismo, um sistema político-filosófico que tem como base a defesa de um nacionalismo excludente mantido pelo estado e que tem no comando uma vanguarda, ou uma figura política totalitária, com poderes plenos sobre o executivo, o legislativo e o judiciário.
Assim como o conceito de socialismo não ser ligado diretamente ao marxismo e ao comunismo, como alguns afirmam: pode-se pensá-lo como o que chamam de social-democracia - sistema que busca um socialismo através do voto democrático - ou a transição do capitalismo para o comunismo, como pensa o marxismo, e mesmo o nacional-socialismo como era o nome do partido nazista, um espécie de fascismo alemão.
A confusão é formada porque as pessoas leem a respeito e juntam como sinônimos  conceitos estranhos entre si. Por exemplo: fascismo não pode ser relacionado economicamente com um sistema comunista, mas pode politicamente se a sociedade em questão tiver um sistema auto-crático; da mesma forma que o fascismo não pode ser relacionado politicamente com o liberalismo, mas pode quando se trata da defesa dos interesses econômicos, um sistema de mercado.
Acontece que todas as ciências possuem suas complexidades e a Ciência Política não é diferente; a ingenuidade pela ignorância confunde tudo de modo que é possível se ver uma pessoa defendendo liberalismo em um partido socialista, ou um capitalista em partido marxista e até fascistas em partido trabalhista e assim por diante.

quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

Humanos, Consciência e Morte

Se nada surge do nada, tudo tem um começo e tudo tem um fim. Só que os motivos de acabar ou de começar são sempre estranhos um do outro e tudo pode causar impressões diferentes de acordo com os objetos que terminam ou que acabam. Por exemplo: o nascimento e a morte, em se tratando dos seres vivos dotados de consciência.
Nesse caso, fala-se dos humanos, seres capazes de pensarem suas próprias existências, portanto o seu início e o seu fim: o nascimento, a vida e a morte. Cientificamente os homens dão explicações de como surge a vida com toda a complexidade da fecundação, assim como as doenças e a velhice que causa a morte; da mesma forma manipulações laboratoriais que são capazes de provocar nascimentos e aparelhos que podem manter pessoas vivas, ou drogas que levam a morte de forma indolor. Mas nenhuma das explicações científicas são capazes de satisfaze-los em suas condições de existência e explicar os seus nascimentos e, principalmente, o seu pós-morte.
Acontece que são dotados de um nível de racionalidade tal que se transforma em consciência, uma capacidade de saber e saber que sabe. Ou seja: perceber sua própria finitude, pois entendem que um dia não existiram e, por isso, um dia não mais vão existir e, aí, a aflição pela existência.
Mas essa consciência não aceita as explicações científicas porque elas explicam o "como", e os humanos esperam o "porque"; por isso muitos entram para uma busca do transcendental esperando encontrar sentido para aquilo que os angustia. Isso porque a consciência se acredita dotada de racionalidade e como tal, ao obter respostas metafísicas e transcendentais, pode pensar já de posse de respostas que lhes satisfaça.
Esquecem, nesse caso, que a consciência, que por hora se angústia pelo pensamento de seu fim, é fruto de uma combinação físico-química ocorridas entre neurônios que provocam o pensamento, as memórias e, com eles, a consciência. Portanto, consciência só existe porque existe uma massa cinzenta chamada cérebro e cujo fim dele será automaticamente também o seu. 
Portanto, se um dia essa massa cinzenta chamada cérebro não existiu e um dia não mais existirá, também a consciência um dia não existiu e um dia não mais existirá. E a pergunta que persiste, "para onde a consciência vai com a morte?" Resposta: "para o mesmo lugar de onde veio, lugar nenhum".

segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

A Magistratura, a Corporação e a Justiça

Sempre se soube que o judiciário brasileiro enfrenta dificuldades para fazer aquilo que na essência é o sentido de sua existência: a justiça; e essas dificuldades que podem ser estabelecidas como de ordem técnico-científica, moral, política e corporativa. Isso porque as pessoas à frente da magistratura não conseguem perceber que a função do judiciário, a justiça, vai muito além da simples aplicação da lei.
Aliás, o conceito de justiça, enquanto ideia da aplicação do que é justo, necessita mais que conhecimentos dos encadeamentos de leis, dos decretos, das portarias governamentais e constituição federal: instituições que se sobrepõem umas às outras e se relacionam, nada mais. Não existe uma lei para cada caso real, para cada caso vivido, e o magistrado precisa interpreta-las e relaciona-las com o fato vivido; mas como fazer sem os conhecimentos básicos de Sociologia, de Antropologia, de Política, de Economia e uma elenco extenso de disciplinas necessárias?
Essas disciplinas são lecionadas nos cursos de Direito, mas em geral vistas como perfumarias - assim como são as propedêuticas em qualquer curso - e os professores têm dificuldade para relacioná-las com o mundo jurídico e, por conta disso, boa parte dos alunos viram-na as costas. Certamente que nenhuma ciência existe isoladamente e todas necessitam de outras que lhe são auxiliares tendo em vista que suas descobertas podem acrescentar à ciência em questão.
Mas , alem de não serem lecionadas de forma mais adequada, essas mesmas disciplinas não são contempladas nas provas para ingresso na magistratura e o resultado são os juízes decidindo questões de ordem social, econômica e cultural a partir de um senso comum. Sem conhecimento da sociedade, das culturas e da dinâmica da economia vêm os preconceitos, a soberba, a necessidade de ostentação e aquilo que mais prejudica o mundo das categorias profissionais, o corporativismo.
Diante dessa situação as pretensões democráticas com a erradicações de vícios sociais como a corrupção, o patriarcalismo, a prepotência, o personalismo etc., que muitos magistrados pensam poder erradicar, fica prejudicada. E quando fazem comparações com juristas de outros países esquecem que esses realizam estudos com afinco de disciplinas como a História, a Economia, Política, Filosofia e uma gama extensa de outros saberes sociais e humanos que podem agregar conhecimentos ao mundo jurídico.