sexta-feira, 29 de abril de 2016

Existência: a Essência e o Acidente

Dois conceitos, oriundos da metafísica aristotélica, chegaram aos dias de hoje e tornaram-se chaves fundamentais para as reflexões sobre a existência de tudo que compõe o universo: essência e acidente. Queria, o filósofo macedônio, explicar que tudo que existe, existe porque fora feito e que cada fazer segue esses dois conceitos de modo que, enquanto a essência se qualifica como aquilo que se repete e caracteriza a espécie, o acidente é o que não se repete e qualifica a personalidade do ser. Exemplificando: ao olhar as pessoas defronta-se com sua essência porque todas elas são humanas, já que, entre essas, pontos se repetem: todas são de carne e ossos, braços e pernas, olhos e bocas, pensamentos, frustrações e medos, amor e ódio. Da mesma forma percebe-se que essas pessoas possuem vários acidentes, já que são diferentes entre si: os seus cabelos são diferentes, diferem no peso e no tamanho, o formato do nariz e da boca são diferentes etc. Das duas, palavra acidente foi a que mais se popularizou porque passou a designar, num senso comum, o sinistro: o incêndio em uma casa, um telhado que desabou, uma batida de automóvel, um atropelamento etc. Isso ocorreu porque, necessariamente, é mesmo acidente, já que – por essência – a casa se destina a pessoas morarem e não a caírem e as estradas para as pessoas transitarem e não para atropelarem umas as outras. O fato é que nem sempre ocorre o que é esperado e, em algum momento, o sinistro acontece: o acidente. Nas suas existências tudo segue pelas duas possibilidades, o que se espera e o que não se espera; entretanto, é preciso que se saiba: a qualquer momento algo contrário pode acontecer. Sendo assim, em uma análise, podem-se utilizar os conceitos tanto em setores da vida social, política e econômica, quanto na busca de entendimento da física, da química, da biologia e assim por diante. Na complexidade da existência todos os seres, e as pessoas em particular, esperam as essências da vida, mas sabem que, a qualquer momento, os acidentes podem interromper aquilo que se iniciou e voltar uma parte do percurso - quando não a estaca zero - ou tomam-se estranhos encaminhamentos. Nos estudos históricos de uma sociedade se percebe muito bem que pode ocorrer a mesma situação, depois de bastante se caminhar para um determinado rumo, sem esperar – a qualquer momento – retroagi-se a pontos diversos e, muitas vezes, a pontos desconhecidos. São os acidentes da vida.

quarta-feira, 27 de abril de 2016

Classe Média e Contradição

Entre os mais ricos e os mais pobres de uma dada sociedade, reside uma parcela chamada, desde o século 18, como classe média. Comumente se reserva a denominação ao sistema capitalista, mas bastante já se usou para designar a parte da sociedade medieval que pairava entre os senhores proprietários de terra e os camponeses despossuídos, ou um pequeno grupo de homens livres entre os senhores feudais e os servos da gleba. Por estar no centro das contradições, essa parcela da sociedade acaba experimentando parte das mordomias da classe superior, tanto quanto parte das dificuldades da inferior. E, nessa contradição, vive um eterno paradoxo: almeja viver como os indivíduos da classe alta – fazer grandes viagens, almoçar em restaurantes caros, usar roupas caras ou comprar carros da ultima linha, mas faz isso contando os trocados, e se apavora quando vislumbra a possibilidade de ter que viver em meio a pessoas da classe baixa. Em qualquer sistema social essa parte intermediária vive o seu paradoxo, espremida entre as duas outras possibilidades, mas, na sociedade capitalista, em que as classes vislumbram a mobilidade, as disputas são ainda mais acentuadas. Nos tempos atuais, pensando em ascensão, mas sem capital, os indivíduos pertencentes a esse grupo procuram as profissões liberais, os pequenos negócios ou fazem concurso para algum cargo na burocracia estatal. Também politicamente esse grupo vive uma contradição: ao se sentir prejudicado por decisões governamentais, recorre sempre aos indivíduos da classe baixa para, juntos, lutarem contra tais encaminhamentos. E faz isso com relativa facilidade porque detém em suas mãos os instrumentos formadores de opinião, desde as salas de aulas, o consultório ou o escritório, até os jornais, as rádios, as televisões etc. Assume um discurso político de defesa de um sistema social favorecedor da classe rica e, em nenhum momento, percebe que os seus males vêm do privilégio desses a quem defende. O estranho é que quando visitam países ricos - que já fizeram as suas reformas de base e que as suas desigualdades sociais já foram amenizadas - acham tudo muito lindo, mas se posicionam contrariamente quando os governos locais tentam desenvolver alguma política social que resolva resgatar a dignidade dos mais carentes. E fazem isso com seus discursos sociais moralizantes (em geral, homofóbicos e racistas), defendendo a família, os bons costumes, a pátria e a igreja. Como precisam ostentar, prezam pelo meio termo, pelo imediato, pelo superficial e tudo que dê algum retorno rápido. Enfim, o indivíduo da classe média nasce, vive e morre em meio a uma guerra existencial; não consegue saber para onde vai nem de onde vem, ou o que faz aqui.

segunda-feira, 25 de abril de 2016

Fascismo

Estados totalitários e autoritários, com seus governantes absolutos, sempre existiram ao longo de toda a história política; entretanto, pensado teoricamente e posto em prática, com um nome, só ocorreu na década de 20 do século passado. E fora Benito Amilcare Andrea Mussolini, o ditador italiano entre 1924 a 1945, o grande teórico que denominou o fenômeno como fascismo, buscando na etimologia dos feixes de varas, carregadas por funcionários romanos, diante de altas autoridades, e o implementou como ideologia. Acontece que uma antiga tradição etrusca, de que uma só vara quebra fácil, mas em um feixe, dificilmente, seriam quebradas; o Império Romano, assentado sobre a cultura etrusca, determinava que lictores (funcionários públicos) carregassem pequenos feixes de varas, amarradas a um machado e, assim, precedessem o caminhar de magistrados, cônsules e imperadores. A teoria de Benito Mussolini de que uma dada sociedade deveria fechar-se em si mesma, não aceitar as inovações sociais, políticas e culturais, se assegurar em uma dada camada social privilegiada e fortalecer profundamente um nacionalismo (ao ponto de se chegar ao uma xenofobia) foi aceita e implementada por grupos políticos e militares em todo mundo. O profundo nacionalismo xenofóbico e homofóbico levou estados a provocarem uma decadência artística, filosófica, jurídica e científica, ressalvando a medicina que avançou com as experiências em pessoas estrangeiras ou opositoras ao regime. Esse foi um dos períodos que o mundo se envergonhou de suas ações: por mais que se falasse em Deus e que o outro é o seu próximo, mataram-se milhares de pessoas, torturou-se, relegou-se a fome ou desprezou-se em campos de concentração. Isso fora feito em nome de uma pureza social ou racial: lugar de branco rico é de branco rico, porque o lugar de negro, de índio, de pobre tem de ser em outro lugar. Nesses estados, onde se instala o fascismo, o legislativo e o judiciário não legislam ou julgam, mas são marionetes que, por vezes, até acreditam estarem fazendo um verdadeiro papel de legislador ou de magistrado, mas que sustentam um sistema que favorece um pequeno grupo privilegiado. Desse pequeno grupo está uma burguesia local da qual fazem parte – entre outros – os proprietários dos meios de comunicação que se encarregam de conduzir a classe média e até os mais pobres, a apoiarem. Foi assim com Mussolini, com Hitler, com Salazar, com Franco e com todos os outros grandes ditadores, ascenderam quando um governo democrático e popular estava iniciando reformas de base na sociedade. Num primeiro momento se enfraquece o governo legítimo até que o governante seja assassinado, deposto ou renuncie; no segundo, num vácuo de poder, surge uma ditadura cruel com um pretenso “salvador da pátria”.

sexta-feira, 22 de abril de 2016

Golpe

Golpe é golpe em qualquer lugar do mundo, pode se chamar impeachment, em Inglês, coup d'État, em Francês ou Staatsstreich, em Alemão, acontecem sempre pelo mesmo motivo: uma parte das pessoas que se relacionam com o estado – uma dada elite - é contrária às decisões governamentais e resolve golpeá-las apeando o governante de suas funções legítimas. Isso pode ser feito através de um assalto armado levando os membros do executivo a prisão, morte ou exílio ou, sutilmente, buscando brechas na lei. No primeiro caso haverá um desgaste interno e externo, os investidores ficarão receosos em mandarem seus dinheiros para o país, além do que necessitará do apoio sistemático de uma “potência mãe”. Portanto, o mais sensato é buscar um dispositivo legal que dê essas condições e que transpareça para todos uma condição de normalidade. Isso porque sempre pode haver algum artigo na carta magna do país que possibilite uma reinterpretação, favorecedora, para a realização de tal evento. A palavra golpe é bastante rejeitada por todos, de modo que aqueles que o praticam o renegam; isso porque o seu conceito, em geral, vem carregado de sentimentos de traição, de derrotismo, de que seus praticantes são perdedores e que, por não aceitarem tal condição, encontram um meio ilegítimo para chegar ao poder. Por isso, golpe precisa que seja estabelecido com toda aparência de normalidade, com o apoio do maior número de órgãos do estado e dos órgãos de imprensa e todo o seguimento social dos descontentes. A expressão, golpe de estado, foi cunhada em 1639, por Gabriel Naudé, no livro Considerations Politiques Sur le Coups d'Etat, quando definiu-o como o ato em que um governante, em defesa do interesse público, viola as leis e regras estabelecidas. Atualmente o conceito se ampliou e golpe de estado se define como o ato de um grupo político que renega as vias institucionais para chegar ao poder e apela para métodos de coação, coerção, chantagem, pressão ou mesmo o emprego direto da violência para desalojar o governante. O fenômeno costuma acontecer quando grupos da sociedade se sentem feridos nos seus interesses econômicos e passam a fazer oposição sistemática às decisões governamentais. Golpe é golpe, independente se o termo é pesado ou não, se as conseqüências econômicas serão desastrosas ou não, se isso passa a imagem de um país frágil institucionalmente ou não.

quarta-feira, 20 de abril de 2016

A Maldade da Hipocrisia

Como disse Noam Chomski, um dos maiores males da humanidade é, sem dúvida, a hipocrisia, o ato de exigir dos outros aquilo que não exige de si mesmo, ou o ato de atribuir aos outros aquilo que não atribui a si mesmo. O hipócrita se mantém como que diante de um jogo: faz discursos diante da multidão, procurando apresentar uma personagem e, numa primeira observação, parece justo, mas que num olhar apurado, acabará se mostrando cruel e desumano. Se nos tempos modernos Chomski viu na hipocrisia um dos maiores males, isso não quer dizer que é um fenômeno moderno ou uma preocupação recente. Há dois mil anos o fundador do cristianismo, Jesus de Nazaré, já percebia e exortava as pessoas com tais atitudes: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! Pois que devorais as casas das viúvas, sob pretexto de prolongadas orações; por isso sofrereis mais rigoroso juízo”; (Mateus, capítulo 23). A palavra tem duas derivações: do latim hypocrisis e do grego hupokrisis. Ambas significando a representação de um ator, uma atuação, um fingimento. Desde a antiguidade a expressão a designa as pessoas desonestas que, na iminência de levar vantagens, representam, fingem, fazendo a defesa de ideias que são contrárias a aquilo que acreditam. E esse fingimento pode acontecer diante de um grande grupo, ou junto a poucas pessoas, na expressão oral, escrita. O hipócrita faz discursos, clamando por justiça, por honestidade, por amor, ou por liberdade e, para isso, usa palavras fortes como família, pátria, Deus, mas na sua consciência reside o saber de suas injustiças, de suas desonestidades, do seu ódio e crueldade. Essa pessoa só não sabe que a sua desonestidade é também para consigo mesmo - pois, para manter a representação, ele necessita mentir para si mesmo. Acontece que a palavra hipocrisia é, por demais, pesada; ela representa as pessoas que são mal vistas, não aceitas para o convívio da sociedade, de modo que ninguém se aceita como tal; aquele que pratica a falsidade, a mentira, a enganação precisa trabalhar a mente o tempo inteiro para dizer a si mesmo que não há nada de errado com suas práticas e que suas atitudes são coerentes. Enfim: o hipócrita é um doente social e, na sua doença, vive acorrentado a sua própria hipocrisia.

segunda-feira, 18 de abril de 2016

Fênix e o Recomeço

Um ser que na academia, na literatura ou nos discursos políticos sempre representou a capacidade de alguém, de um grupo de pessoas ou mesmo de um sistema de se reerguer e se postar de volta, na ativa, é o lendário pássaro da antiguidade, fênix. Isso porque os humanos, com sua capacidade de consciência, buscam sempre um entendimento para a sua condição temporal, bem como para suas ações na existência. Não só na Grécia antiga, mas vários povos tiverem o pássaro fênix com representação em suas crenças: na encarnação do deus Rá, no Egito – com o nome de bahnu - ou mesmo entre os cristãos que sempre relacionaram a sua capacidade de renascer com a morte e ressurreição de Jesus. Pássaros com essas semelhanças, e nomes diversos, apareceram em várias sociedades antigas, como entre os fenícios, os assírios, os persas e até entre os chineses. Na mitologia grega esse ser é representado por um pássaro muito grande, com a semelhança de uma águia, com penas douradas e muito forte; sua força dá-lhe condições de conduzir em seu bico, até o peso de um elefante. Sua grande característica e que ficou emblemática na cultura ocidental é a condição de impossibilidade de derrota: ao perceber a hora de seu fim, a ave prepara a própria pira mortuária e se posta ao centro, virando cinzas em poucos instantes. Logo depois, quando todos acreditam na sua morte, dessas mesmas cinzas renasce sempre um novo pássaro, uma nova fênix, ainda mais linda e radiante. E, num eterno renascer, seu berço é também seu túmulo. Essa condição de um ser alado, da cor do sol, que voa nas alturas e que pode retornar ao ponto de partida para sempre um recomeço, emoldurou o pensamento literário, artístico e filosófico ao longo dos tempos. Várias corporações e sociedades trazem em seus estandartes a figura desse ser do eterno retorno, como representando algo indestrutível, que sobrevive mesmo nas piores agruras, mesmo com todo o tipo de pressão e torturas. O pássaro fênix não pode simbolizar a história e mesmo os membros dessa história, já que as pessoas morrem e os fatos não retornam, mas pode representar idéias e, nela, os anseios, os sonhos e as vontades de luta. Assim como os mitos de deuses e seus animais sagrados permanecerão enquanto pessoas neles depositarem suas crenças, também as vontades de lutas dos povos permanecerão enquanto pessoas estiverem dispostas a lutarem.

sexta-feira, 15 de abril de 2016

O Medo e a Sobrevivência

Diante da evidência de um risco que poderá pôr em perigo a integridade do indivíduo, é natural que esse sinta a experiência do medo; conceito esse que pode ser definido como um instrumento de defesa e que tem como propósito primordial a proteção. Na situação, o cérebro do envolvido calcula a proximidade do objeto do temor, a sua intensidade, estabelecendo as possibilidades e a aproximação do perigo; com isso, o sistema neurológico e toda a estrutura de defesa do corpo é posto em alerta. Dessa forma, pode-se dizer que, juntamente com o apetite sexual, o medo tem uma função primitiva que é a de perpetuação da espécie. O seu sinônimo pode ser ainda temor, pavor, pânico, susto ou terror e relaciona-se com as fobias, como a dificuldade para permanecer em lugares altos, ou na presença de aranhas ou próximo armas de fogo etc. Nos relacionamentos sociais o pavor também se manifesta. Nesse caso, pode ser a iminência de uma nova ordem econômica ou o horror ao relacionamento com pessoas de outra opção sexual, de outra religião, de outra nacionalidade ou de outra etnia. Para a sociedade, o problema é que a pessoa amedrontada vive na constante insegurança, sem saber ao certo quais passos deve dar e, nessa condição, pode apresentar várias reações que vão de alterações físicas no próprio corpo a alterações psíquicas, mudando o comportamento. Com medo a pessoa tem duas opções: fecha-se em si mesma ou torna-se extremamente agressiva e até suscetível a ações inimagináveis. Entretanto, o amedrontado não está, necessariamente, embasado em fatos reais; ele pode estar experimentando um estado de espírito causado por ilusões provenientes de crenças estabelecidas anteriormente. A conclusão que se tira é que se por um lado o medo poder ser instrumento de defesa de qualquer indivíduo, pode também tornar-se um sistema opressor levando-o a um inferno em vida. Se o medo é um fenômeno natural, o indivíduo amedrontado precisa, encontrar o meio termo entre os cuidados com a vida e a própria existência no pavor; afinal, com ou sem medo a vida segue e o fim chega.

quarta-feira, 13 de abril de 2016

Mulher, História e Reação

A historia da humanidade, desde os primórdios da civilização até os tempos recentes, tem sido contada apenas pela metade. Isso porque segregou a mulher, limitando- nas suas ações, ou retirando-a dos relatos de participação nos grandes feitos. Em todos os tempos existiram mulheres que foram para além dos papéis tradicionais de esposas, de mães ou de amantes: as grandes rainhas, as grandes pensadoras, as grandes inventoras e mesmo grandes guerreiras, mas que foram ocultadas pela historia oficial e registradas como prostitutas ou loucas, tendo em vista que suas presenças obscureciam os interesses de grupos com pensamentos machistas. Somente no último século, depois de tantas lutas por direitos humanos e liberdades individuais é que a mulher passou a ser aceita – mesmo que timidamente - como parte integrante, ativa, da sociedade. E nesse curto período, ela já mostrou que poderá executar, com maestria, as variadas atividades até hoje executadas, exclusivamente, por homens. Além do que, já mostrou também que a sua presença no mundo do trabalho traz uma nova concepção de vida aos relacionamentos humanos. No entanto, as mulheres devem saber que se vive um momento de transição de uma sociedade de cultura machista e conservadora, para uma sociedade cultura integradora da humanidade por inteiro. E esta parcela machista (formada de homens e mulheres), por ser conservadora, não está acostumada com uma nova cara, com uma nova forma de entender a vida e emperra as iniciativas em que se ressaltam as qualidades femininas. Nesse período de transição, a mulher que ocupa cargos de destaques, invejados por muitos, precisa desempenhar seu papel para que o trabalho proposto seja bem feito, como vai querer qualquer executor, mas também precisa provar para a sociedade que mulher consegue executar tal projeto. Isso porque vozes ao seu redor estão prontas para dizerem que se não deu certo é porque foi executado por mulher; como se ela tivesse que caminhar para frente, mas nunca podendo deixar a sua retaguarda desguarnecida. A chegada da mulher ativamente na história da humanidade, como grandes líderes políticas, grandes filósofas, grandes cientistas etc; causa perplexidade em alguns e, descontentamentos em outros, porque altera substancialmente o sistema vigente. E, como se sabe, toda alteração de um sistema, quer seja social, político ou econômico, gera insegurança motivada pelo medo do estranho, do desconhecido e, conseqüentemente, ocorrem reações contrárias.

segunda-feira, 11 de abril de 2016

A Razão, o Espanto e o Mercado

A filosofia é genuinamente humana e ela nasce com o espanto, a estranheza, uma sensação que ocorre quando as pessoas olham ao seu redor e buscam explicações como uma forma de estabelecer um cosmo em meio ao caos. Sem o espanto não haveria o pensar e, conseqüentemente, os conhecimentos daí originados. Isso fora o que disse o pensador estagirita, o macedônio Aristóteles, ao analisar os conceitos formulados por seu mestre, Platão: doxa e episteme. O primeiro conceito fora entendido como uma mera opinião, desprovido de análise, de estudo e de qualquer comprovação e, o segundo, o seu contrario - o conhecimento elaborado, investigado, comprovado etc. Buscando dos pensadores antigos pode-se pensar os tempos atuais e a possibilidade, ou não, de os humanos se chocarem, se apaixonarem ou se indignarem com o que ocorre ao redor. Estaria o homem do século XXI impossibilitado de se espantar diante do que está a sua volta, essa que é a condição primordial e que, portanto, dá aos humanos a possibilidade de transformar o mundo? Certamente que não todos, mas uma parcela considerável suficiente para continuar a mudar a cara do mundo atual e selar os destinos. Se uma parcela da humanidade perdeu a capacidade de se indignar, de se espantar ou de se apaixonar, duas perguntas se tornam inevitáveis: para onde caminha a maioria desses humanos? ou, quais as causas desse fechamento em si, vivido pelas pessoas? A primeira pergunta não tem resposta, já que não existem profetas a dizerem os caminhos e todos os saberes são voltados apenas ao passado. Restando a segunda pergunta. Sendo assim, faz-se necessário que se volte para essa tal modernidade construída a base da razão, mas que foi corroída pelo mercado; inventaram-se os meios de comunicação, mas transformaram-no pela busca incessante de lucro. O que deveria informar passou a ser muito mais um formatador de pensamentos e as pessoas param cada vez mais de se espantarem, acreditando já saberem. E assim, as hordas de tolos se avolumam a caminharem pelas ruas, “tentando vencer na vida”, crentes de que são livres, que dão a melhor de si para educação dos filhos e que, ao morrerem, merecerão o galardão celestial. Qual nada. Reproduzem um sistema injusto e que se volta sempre contra si e contra os seus filhos.

sexta-feira, 8 de abril de 2016

Impeachment, o Tudo e o Nada

Na filosofia o tudo e o nada fazem partem de um mesmo pensamento: se tudo é tudo, o nada é nada. Em outras palavras: quando se determina que todos devam fazer uma determinada ação, um esperará pelo outro e sabe-se de antemão que ninguém o fará. Essa é a conclusão que se pode esperar num país como o Brasil em que, ao mesmo tempo, se pede o impeachment da presidente da República, pede-se também do seu vice, assim como do presidente da Câmara dos Deputados e, agora, do ministro do Supremo Tribunal Federal. Todos os poderes da República podem sofrer um processo de impeachment, pelo menos é o que reza na Constituição Federal de 1988, um estatuto que pode ser chamado pelos órgãos específicos da República. Em geral os países, ansiosos por construírem uma democracia, estabelecem-no em lei, mas somente os usam em casos extremos. Isso significa que todos os homens que se posicionam a frente do estado não podem pensar que estão acima das próprias leis que representam. Nos outros países chamam-no pelo nome correspondente em seus idiomas pátrios (acusa – no Italiano, Anklage – no Alemão, mise en accusation – no Francês etc), enquanto no Brasil usa-se a expressão em Inglês por dependência cultural e uma série de outras razões que não cabem aqui ressaltar. A pergunta é: se há pedidos de impeachment contra representantes dos três poderes, quem estará habilitado a estudar a situação do outro, com competência e isenção, ao ponto de estabelecer um julgamento digno e coerente? Ou, as pessoas, de um modo geral, não estão sabendo as exatas competências das suas próprias instituições e as medidas desse estatuto. O que não pode permanecer é o pensamento do tipo “não te quero”, “não te gosto”, ou “falastes coisas que não devia, então entro com um pedido de impeachment”. Parece que a segunda opção é a mais real nos momentos políticos em que o Brasil está vivendo. São médicos, engenheiros, administradores, artistas, jornalistas e até advogados que nunca leram um só texto sobre política, sobre cultura ou sobre a dinâmica de uma sociedade e se aventuram contra “os moinhos de vento”. A política se fragiliza por que passa a ser vista, não como um instrumento legitimo de condução da sociedade, mas como um jogo, uma partida de futebol em que se joga com os atletas a disposição e o incentivo da torcida. Enfim: quando se fala em impedimento de continuar nas suas funções para membros dos três poderes, o sistema como um todo se fragiliza e o próprio estatuto do impeachment se vulgariza.

quarta-feira, 6 de abril de 2016

Política, Justiça e Fragilidade Democrática

Dois monstros, gêmeos, vivem a espreitar as frágeis democracias pelo mundo a fora: a judicialização da política e a politização do judiciário. Dois monstros porque as suas persistências denotam uma não aceitação do projeto democrático por um dos lados do jogo político, impossibilitando com isso o diálogo entre os diferentes. De um lado os agentes políticos sem acordos, sem aceitação da derrota, ocorrida na legitimidade do voto, recorrem ao judiciário com alegações variadas: passou-se por cima da constituição, feriu-se a lei de número tal, já existe tal resolução etc. Do outro, ministros e desembargadores, vêm nisso uma possibilidade de interferência nos encaminhamentos da sociedade e abraçam para si uma decisão que deveria ser fruto de um debate político. Os resultados são os mais perniciosos. Em primeiro lugar, atravanca-se a economia, dificultando o encaminhamento administrativo por esticar os prazos das decisões; em segundo, aumenta-se substancialmente o volume de ações no judiciário, atrasando cada vez mais o seu já moroso trabalho; em terceiro, se perde a atividade política, própria das sociedades autônomas, de um povo livre. Acontece que qualquer sociedade entra em decadência econômica, social e cultural quando os seus agentes políticos – em suas forças antagônicas, mas como legítimos representantes dos variados setores – perdem a capacidade de diálogo. Em outras palavras: o funcionamento do estado é complexo e melindroso na sua essência porque atua diretamente nas diferenças da sociedade. Quando o judiciário resolve agir através de suas determinações, as partes aceitam, mas continua o ressentimento e os próximos embates serão sempre maiores. Como seria se cada policial, cada empresário ou cada jornalista acreditasse que pode fazer interferências, a sua maneira, para resolver os problemas da sociedade; ou se um cidadão comum inventasse de “fazer justiça com as próprias mãos”? Por outro lado, cada vez que o judiciário se exime de decisões políticas, se resguardando a proteger a lei e “devolve a bola” para que os agentes políticos, legitimados pelo voto, sejam forçados a conversarem e decidirem, a pressão popular tem a possibilidade de conduzi-los a por “o carro nos eixos”. É preciso que cada um cumpra o seu papel. Não é possível que uma arruela faça papel de rolamento, nem que um eixo possa ser usado como manivela; para que a máquina funcione a contento é preciso que cada agente faça a sua parte como fora decidido em leis e sedimentado através dos tempos.

segunda-feira, 4 de abril de 2016

A Busca da Felicidade

Os seres vivos buscam sempre uma acomodação, uma condição que não perturbe a sua existência e a da sua espécie; com os humanos isso é bastante perceptível nas suas lutas por uma vida melhor para si e para os seus descendentes. Muitas vezes essas lutas são contaminadas por necessidades criadas nos meios de comunicação, fazendo com que as pessoas queiram e pensem que só serão felizes se consumirem determinados produtos; nesse caso a felicidade é falsa já que está atrelada diretamente a um planejamento mercadológico. Felicidade é um daqueles conceitos complexos, portanto de difícil compreensão: um estado de plenitude, satisfação e equilíbrio físico e psíquico. Dessa forma, mesmo o sofrimento e a inquietude da alma podem ser transformados em emoções boas ou sentimentos de contentamento e de alegria intensa. Em linhas gerais pode-se dizer que o conceito traz o sentido de bem-estar ou de paz interior. Inúmeros são os pensadores que se debruçaram sobre as suas diferentes abordagens: a definição de uma natureza da felicidade e que tipo de comportamento ou estilo de vida se leva à plenitude. Os antigos gregos chamavam-na de eudaimonia, um termo ainda bastante usado em algumas áreas da Filosofia. Nos tempos atuais, quando alguns pensadores tratam desse tema, visando entender a satisfação de si e das pessoas ao seu entorno, preferem o termo prazer. Mas, mesmo sendo difícil definir a felicidade e a sua medida, alguns investigadores se aventuram em afirmar diferentes métodos de medir o nível de felicidade levando em conta fatores físicos e psicológicos, tais como envolvimentos religiosos ou políticos, estado civil, paternidade, idade, renda etc. A dificuldade é encontrar os cominhos para a tal felicidade, ou se essa pode ser encontrada. Já houve quem dissesse não ser possível, mas apenas chegar a picos momentâneos e a seguir voltar ao mundo da eterna tristeza. Acontece que, naturalmente, as pessoas têm suas memórias e com elas os seus sonhos e as suas vontades legítimas, aquelas que estão muito além das imposições mercadológicas; o que precisam fazer é seguir ao seu encalço.