quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Mito

Um conceito muito usado pelos antropólogos para definir a produção de conhecimentos pelos povos mais antigos, como forma de explicar fatos da realidade e fenômenos da natureza, as origens do mundo e do homem e que não eram compreendidos por eles, é o mito. A complexidade desse conceito está na utilização de personagens especiais, de deuses e de heróis e todos carregados de simbologias; componentes esses que são misturados a fatos reais e a pessoas que, historicamente, sabe-se que existiram. Dessa forma, o objetivo primeiro do mito é transmitir conhecimentos e explicar fatos que a ciência de um povo ainda não explicou e faz isso através de rituais, de cerimônias com danças, sacrifícios e orações. Dizendo de outra forma, um mito pode ter a função de manifestar conhecimentos teológicos, mas também o de explicar temas desconhecidos e tornar o mundo conhecido ao Homem. Entretanto, o mais estranho é que mito é sempre o do outro e nunca o de si próprio; o seu é sempre religião, é verdade a ser seguida, é fé viva. Por exemplo: quando se fala em origem do universo, do céu e da terra, os gregos antigos falavam de Urano e Gaia que deram origem aos titãs, seus filhos, Oceano, Céos, Crio, Jápeto, Hiperião, Tétis, Teia, Febe, Reia, Mnemosine e Têmis, assim como suas façanhas; isso se considera personagens e fatos míticos ou mitológicos. Até porque isso foi uma crença tão antiga e que deixara de existir, há tanto tempo. Mas, quando se fala de um ser onipotente, onisciente e onipresente, que fez o céu e a terra e tudo o que nela há, que mandou seu unigênito filho para livrar a humanidade dos seus pecados, necessariamente, se diz que é uma religião e não mito. Pelo menos quando for analisada por um indivíduo de cultura cristã ocidental. O mesmo acontece com respeito aos mitos dos indígenas brasileiros, quando falam de Tupã e Jaci, representando o sol e a lua e suas relações com as origens do universo, bem como com os fenômenos da natureza. Para o homem branco há um desprestígio para com essa expressão cultural, rebaixando-a a uma condição mítica e, de certa forma, a um degrau inferior. Aí reside a semente das discórdias e guerras por motivos religiosos: todos acham que têm razão, todos pensam que são os únicos que estão no caminho certo e, conseqüentemente, os outros, aqueles que não possuem a mesma compreensão, seguem por um caminho errado.

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Relações Internacionais e Fragilidade Política

O que chamam de Direito Internacional não passa de frágeis acordos entre países, visando sanar dificuldades econômicas, políticas e culturais, comuns nas relações entre povos; uma área que não pode ser comparada a outras como o Direito Civil ou Penal, por exemplo. Esses acordos funcionam enquanto os dois lados se submetem a montagem de uma arquitetura de relações políticas, coagidos pelo pensamento de possíveis resultados catastróficos para suas economias. Durante toda a Idade Média, e parte da Idade Moderna, a política internacional, entre países cristãos, foi mediada pela figura forte do Papa que, após ouvir as partes, decidia. Com a Reforma da Igreja o poder papal se viu fragmentado e os conflitos aumentados, motivados por problemas religiosos, territoriais e econômicos intermináveis. Por isso desenvolveram-se as políticas de arbitragens e acordos internacionais, mas que não suportaram as forças de interesses dos países economicamente desenvolvidos. E os resultados foram as invasões napoleônicas que acabou alterando a política internacional em todo o mundo, as guerras de unificação e, posteriormente, as duas guerras mundiais. A grande prova que o Direito Internacional é frágil foi o que aconteceu naquilo que os historiados chamaram de Partilha da África e Partilha da Ásia; com réguas, compassos e transferidores as potências européias dividiram a África e a Ásia de acordo com seus interesses econômicos. O mesmo fizeram os Estados Unidos da América quando alertaram as potencias imperialistas pelo mundo afora que não tocassem no continente americano, afirmando a doutrina Monroe, o que ficou conhecido como pan-americanismo: “a America é para os americanos”. Na história recente os relatos não são diferentes, mesmo com a criação da Liga das Nações, de 1919, não se consegui evitar a Grande Guerra Mundial; ou, mesmo com a criação da Organização das Nações Unidas, durante a Guerra Fria, estadunidenses e russos invadiam povos e impunham suas políticas de acordo com seus interesses. Atualmente, mesmo com a negativa da ONU, os Estados Unidos invadiram o Iraque e impuseram o terror àquele país islâmico, matando milhares de civis. Que são importantes os tratados internacionais e todo o trabalho diplomático entre os povos, certamente que sim; são necessários, mas o que não se pode é ter a ingenuidade de pensar que as decisões tomadas pelos países são isentas e que os povos que ditam as regras pelo mundo a fora não o fazem visando o melhor para si.

sexta-feira, 26 de agosto de 2016

A Arte de Fazer Política

A vida em grupo é uma arte das mais complexas e difíceis de aprender; pior: pelo fato de todos os humanos serem jogados na existência e obrigados, simplesmente, a viverem, todos pensam saber o suficiente. E é essa complexidade que revela a necessidade de entendimento de outra arte, a que se aprende quando se tem atenção ao grupo ao qual pertence, a arte de fazer política. A política é a capacidade de negociar. Acontece que vivendo em grupo, as pessoas acabam caindo em contradições, em necessidades e em interesses próprios e de grupo; isso resulta em conflitos. Ora, é aí que entra a necessidade de negociação: a política. E a negociação acontece tanto nos pequenos grupos, quanto nos grandes – nas cidades e nos países: como não é possível que todos os habitantes de um mesmo país, ou de uma mesma cidade, se reúnam para dirimir suas necessidades, nas sociedades democráticas se escolhe um pequeno grupo de representantes que se encarregarão de fazer tal trabalho. Portanto, em tempos que a população é chamada para fazer a grande política, em que se escolhem os seus representantes, é comum que se pense e se discuta a respeito do que se quer para si e para o restante da sociedade. Alguns cidadãos se soltam a produzir críticas e propostas sobre os mais variados setores, do sistema público ao privado. Nesse momento é preciso cautela por que a decisão do voto tem implicação direta nas políticas que serão desempenhadas nos anos vindouros. Isso quer dizer que não basta que o eleitor não venda seu voto, não troque-o por benefícios para si, mas que analise as propostas de cada candidato, a sua história, a sua vontade de mudanças e, acima de tudo, a sua sensibilidade para as causas humanísticas. Esse indivíduo, a quem se deposita um voto de confiança, deve ser aquele que se tem acesso não só no período de eleição, mas que – depois se tenha como fazer contato e se possa acompanhar suas decisões junto a estrutura de poder. É preciso que se pense no sistema eleitoral como um processo de mudança amplo para sociedade, como um momento importante em que a implantação de políticas voltadas para as necessidades da sociedade possa acontecer. Vida humana é mais que o respirar e o existir. A vida em grupo necessita de política e é dela que depende o preço do café, a passagem do ônibus, o médico no postinho, os buracos nas ruas, a vaga na creche e também as leis que prendem e soltam os indivíduos. Viver é sim uma arte complexa, difícil de desempenhar, mas seu aprendizado depende de bem pouco: depende de se perceber membro de um grupo e se fazer agente dessa transformação.

quarta-feira, 24 de agosto de 2016

O Pensamento de Marx e o Marxismo

Certamente que o pensador mais lido, mais criticado, mais amado e também mais odiado, nos últimos 150 anos, foi Karl Heinrich Marx; sabe-se que nenhum outro influenciou tanto a política, a economia e o modo de vida da humanidade nesse período. No entanto, é também o menos entendido e, por conta desse não entendimento, fala-se dele as mais variadas inverdades; em geral involuntariamente, por conta de um desconhecimento das suas ideias. Em primeiro lugar, é comum generalizar marxismo, um adjetivo cunhado em cima de seu nome para designar o pensamento daqueles que seguem suas idéias, e socialismo, um outro conceito que aglutina os ideais políticos voltados para o social. Se o termo socialismo se refere a um conjunto de ideias de esquerda, anticapitalista, mas é muito amplo e congrega em torno se si vários modelos políticos e econômicos distantes do marxismo, desde liberais e democratas, até revolucionários e marxistas. Por outro lado, o conceito de marxismo se conflita com marxiano: o primeiro, como foi dito, não agrupa ideias de Marx, mas as daqueles que concordam com seu pensamento; o segundo, é propriamente o pensamento de Marx. Alguns, por ignorância, afirmam que o pensador alemão não foi marxista, que ele teria descartado por discordar; certamente que não: esses conceitos que levam o sufixo “ista”, junto ao nome de alguém, só vai existir anos depois de sua morte para designar aqueles que seguem suas ideias. Afirmam tais coisas por ignorância, tendo em vista o desconhecimento da vida, da obra, da história e de todo o movimento político em torno de seu nome. Dificilmente se encontra alguém que tenha lido quatro ou cinco livros seus, mesmo os mais conhecidos e comumente citados: O Capital, Ideologia Alemã, Manifesto Comunista ou Miséria da Filosofia. Uma outra confusão que se faz é o estabelecimento de uma relação contraditória com o anarquismo, como se esse fosse, ou uma desorganização completa, ou um ideal político e econômico muito diferente do marxismo. Ora, o russo Mikahil Bakhunin e o alemão Karl Marx pertenciam ao mesmo movimento dos trabalhadores e defendiam as mesmas lutas socialistas, mas entraram em conflito quando chegou a dúvida: após a revolução operária, o que fazer com o estado, essa instituição que fora soerguida como sustentação da burguesia? O primeiro pensador defendeu a sua eliminação total, enquanto o segundo, a sua manutenção como instrumento de transformação. A crítica é necessária e é sempre uma força dialética que alimenta a mudança transformadora. Aliás, essa foi uma herança hegeliana e kantiana de Marx; mas. para isso, é necessário o devido conhecimento das questões em curso; caso contrário, tal fala será algo inócuo e revelador de desconhecimento por parte do sujeito falante.

segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Os Sertanejos e a Guerra do Contestado

Uma grande prova de que a história serve como instrumento de dominação - contada pelos vencedores - é o pouco, ou nada, que se sabe sobre a Guerra do Contestado, um conflito armado entre uma população cabocla e os representantes da recém-instalada república brasileira. O evento foi travado entre outubro de 1912 e agosto de 1916, numa região rica na produção de erva-mate e madeira, disputada pelos estados brasileiros do Paraná e de Santa Catarina e saldo final de milhares de sertanejos mostos. Pouco ou nada se sabe sobre a Guerra do Contestado porque os heróis foram sertanejos, analfabetos e pobres que se armaram e resistiram bravamente aos os interesses imperialistas do governo brasileiro. Acontece que esses sertanejos foram capazes de se armarem como puderam e enfrentaram o exército brasileiro que esse teve de usar armamentos pesados, até avião para reconhecimento. O conflito originou-se basicamente nos problemas sociais da região, decorrentes da falta de uma reforma agrária e da insatisfação com a República. A ausência do Estado era algo notório: o governo abriu as portas da a economia local para as multinacionais estadunidenses sem levar em conta as condições do seu próprio povo ao longo do território. A única esperança era uma religiosidade sincrética que esses sertanejos, abandonados a própria sorte, a utilizaram como instrumento de aglutinação para a luta. Assim, em torno de uma força popular religiosa, militar e popular, eles enfrentaram os interesses entreguistas do governo da época. Aliás, todo o conflito aconteceu porque os sertanejos contestaram a doação que o governo brasileiro fez aos madeireiros e à empresa dos Estados Unidos, Southern Brazil Lumber & Colonization Company, expropriando madeiras e terras que legitimamente os sertanejos entendiam como seus. E os fatos desembocaram num entrevero de grandes proporções: um monge, chamado São João Maria que visitara a região havia morrido e o surgimento de um outro, com o nome de José Maria, mas que para os sertanejos era o mesmo que retornava e que também morreu. Um terceiro, também chamado de Jose Maria que apareceu na região, seria o retorno dos outros dois ou era um mesmo monge. A religiosidade desses caboclos era a expressão de um povo abandonado, uma mistura de Catolicismo Romano com expressões religiosas dos povos indígenas e afros da região. Se pouco ou nada se sabe sobre a Guerra do Contestado, isso talvez seja porque os vencedores sintam vergonha dos resultados do que tivera fim do conflito: além dos milhares de brasileiros mortos, as terras e as madeiras foram sim passadas para a multinacional estrangeira.

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

O Eterno Retorno

O conceito filosófico de eterno retorno já fora postulado pelo estoicismo, uma antiga corrente de pensamento da Grécia antiga, que propunha a eterna repetição das existências no mundo no qual tudo sempre extingue, mas isso para voltar a recriar-se. Em uma constante circular, a terra, as árvores e as pessoas com suas vidas, suas paixões, alegrias e tristezas, e tudo mais que existe, finda para, em seguida, voltar a ser o que um dia já fora. Mas esse também fora um conceito, mais tarde, utilizado por Friedrich Nietzsche pensador alemão (1844/1900) que trabalhou-o em vários de seus textos: Assim Falou Zaratustra, no aforismo 341 de A Gaia Ciência", no aforismo 56 de Além do Bem e do Mal, entre outros. Ele pede para imaginar que um dia, um ser extraordinário viesse até a pessoa e determinasse que se passaria, novamente, por tudo que já passou até o presente momento. Tudo se repetiria, os mesmos atos que já praticou, com os mesmos medos, felicidades e sofrimentos, assim como a mesma árvore que renasce e a mesma fruta que cai e o mesmo verme que a come. Nesse eterno retorno, a realidade atual não tem uma finalidade em si, nem se tem um objetivo absoluto a cumprir e, por isso, ocorrem as alternâncias de prazer e desprazer durante toda a existência. Não que a vida seja cíclica de forma exata e demarcada, mas que tudo se reporta às nuances de vivências já ocorridas que se complementam, dão o colorido e valor às existências por si mesmas. O homem criou o tempo como forma de medir as suas ações e tudo que está a sua volta, de modo que o que hoje existe um dia não foi e um dia não mais será. Dessa forma vive-se uma atemporalidade. Mas, nesse conceito do eterno retorno, de outro modo, tudo volta a ser como já fora antes, com vivências em repetições. Ou seja: os caminhares da existência não ocorrem de um modo exatamente igual ao outro, mas são variações de sentidos já vivenciados, faces de uma mesma realidade. A alegria e a tristeza que alguém sentiu em algum momento, não serão iguais no futuro, mas voltará a experimentar essas situações em suas diferentes variações. Nessa constante de voltas e voltas, num eterno retorno, alguém poderia argumentar que a vida não tem sentido, mas acontece que não precisa ter; o que precisa é experimentá-la melhor, fazê-la sempre melhor. Em outras palavras: viver num constante aprimoramento.

quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Brasil: a Paz e o Comodismo

Para alguns, o fato de o Brasil nunca ter vivido internamente um conflito de grandes proporções é a maior benção que um país pode querer, mas – para outros – as grandes dificuldades econômicas, políticas e sociais vividas, num constante arranjo e desarranjo, se deve a um pacifismo comodista. Os dois lados podem ter alguns pontos de razão tendo em vista que os países que hoje se firmam em economias estáveis, com grandes investimentos em ciência, cultura e educação, outrora viveram momentos cruciais de guerras com seus visinhos ou conflitos intestinos intermináveis, mas que outros, experimentaram guerras internas e externas e hoje não sustentam fortes economias, possuem deficiências em investimentos sociais e culturais. Se alguém afirma que o Brasil não experimentou conflitos relevantes outro poderá questionar: “o que dizer de uma Guerra dos Farrapos, Guerra do Contestado ou das Balaiadas etc.” Acontece que esses conflitos ocorreram de forma localizada e, geralmente, entre forças regionais contra o poder central, sendo movimentadas por soldados leais e rebeldes; o cidadão comum ficava sabendo pelos jornais. Além do que, em geral, terminavam em acordos a medida que as elites locais conseguiam do governo central aquilo que os levaram a pegar em armas. As outras experiências foram a Guerra do Paraguai e a Segunda Guerra Mundial, mas essas aconteceram fora do território brasileiro e não levou o cidadão comum a vivenciar diretamente o conflito; a não ser pela necessidade de produzir mais e mais para manter os gastos. A população, em nenhum momento presenciou uma intensa mortandade, com forme, doença e toda a miséria, própria de uma grande guerra civil, por exemplo. Os livros escolares até dão algum destaque para esse ou aquele entrevero; e as crianças são levadas a decorarem nomes e datas como importantes para a história. Algumas províncias tentam enaltecer determinadas convulsões sociais que ocorreram internamente, dão a elas um coroamento, mas não passam de tentativas de se construir heróis e fatos como relevantes com o intuito de fortalecer um sistema de dominação. Esses conflitos aconteceram apenas quando os lucros ou os privilégios de um pequeno grupo de poderosos estiveram em perigo. Acontece que os povos que enfrentaram guerras intermináveis viram morrer não só os seus entes mais queridos, mas também os seus preconceitos, as soberbas, a prepotência e o egoísmo. As pessoas que viram seus países envolvidos completamente em um grande conflito perceberam a necessidade de coesão e solidariedade. Isso, porque aqueles que enfrentaram as mais cruéis guerras sentiram no seu próprio corpo a finitude de uma existência: em algum momento tiveram de dividir o cobertor, ou um prato de comida, com o desconhecido ao lado.

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Pais e Filhos: Amor e Crítica

A relação de pais e filhos é um fenômeno natural em que homens e mulheres, assim como seres animais, se relacionam e dão origem a mais seres da espécie, assim o planeta se mantém habitado e, mais ou menos, equilibrado. No entanto, família é uma instituição social criada ao longo da história, nas mais diferentes culturas, com o intuito de acolher e proteger um determinado grupo de pessoas com relação de parentesco. É comum, portanto, que as pessoas se relacionem e acreditem que o ato sexual e, conseqüentemente o nascimento dos filhos, ocorram como algo natural da família. Mas é preciso que se faça um certo distanciamento entre a instituição e o fenômeno da procriação da espécie: algumas pessoas constituem família, mas rompem laços, recriam outros grupos; no entanto, a relação entre pai e filho continua muito além dos relacionamentos, dos casamentos ou amores feridos. A partir de uma relação que envolve passionalidade, racionalidade e tradição (aqui com a licença de Max Weber) entrelaçam-se os papéis em uma relação de amizade, de parceria e cumplicidade. Isso acontece de forma que o novo indivíduo a chegar à sociedade é apoiado, incentivado e, por vezes, criticado por esse indivíduo mais velho, como forma de fazê-lo alguém melhor integrado na sociedade e autônomo. O ponto básico nesse relacionamento é a crítica, um conceito tão complexo, rejeitado e temido, mas que é nessa situação que acontece na sua essência. O pai é a figura que se sente na obrigação de tecer as mais severas críticas ao filho; mas faz isso por amá-lo tão profundamente. Acontece que o amor que ele sente pelos seus faz com que passe por boa parte de sua vida a preocupar-se com aqueles que são seus descendentes e os encaminhem em suas vidas. Em geral, quando se comente as relações humanas, é comum que se fale sobre amor, mas - como se sabe - esse sentimento se manifesta de forma e intensidade diferente entre os membros de um dado grupo. Se esse sentimento estranho e incompreendido, se manifesta diferentemente com os membros do grupo, onde se pode perceber com clareza é entre pais e filhos. Certamente que toda regra tem exceção, mas é perceptível que os pais amam mais os seus filhos que o contrario dessa afirmação e isso fica claro quando as pessoas, mais tarde, também serão pais; mas o mais interessante é que isso pode ocorrer também, e com toda a intensidade, para com os filhos não biológicos. Enfim, a idade segue seu curso, as famílias se vão, as pessoas envelhecem, mas a relação pai-filho permanece.

sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Partido Político

O distanciamento entre as ações de uma determinada elite política e o restante da população carece de análise criteriosa com o intuito de entender os reais motivos desse fenômeno. Para explicar isso, uma série de pontos aparece, como: a manipulação da mídia, o mandonismo de governantes, a falta de instrução de uma parcela média da população etc. Diante disso não há nada a negar, mas outro dado necessário nessa analise é a construção partidária e o conceito de partido político que se tem por parte dessa população. Em primeiro lugar, não tem como haver uma sociedade democrática sem partidos políticos consolidados; em segundo, sem essa consolidação os cidadãos não acompanham as agremiações políticas, o que abre espaço para o mandonismo. E o resultado é uma sociedade despolitizada, desinformada, medrosa, ou até corrupta, no trato da coisa pública. Pessoas que se posicionavam contra ou a favor os governantes sempre existiram ao longo da histórica, ou pessoas que divergiam de seus contemporâneos e assim por diante. Mas foi somente na modernidade, e até mais recentemente, que se consolidaram as agremiações chamadas de partidos políticos. A ideia é que tal agremiação represente os interesses, ou as necessidades de uma parte da sociedade (por isso o nome de partido). Os partidos políticos, quando são criados, suas lideranças elaboram os chamados programas partidários, um conjuntos de tópicos que deveriam balizar todos os encaminhamentos políticos: o que se quer com a saúde, com a educação, com o transporte, com a segurança, com a economia etc. Ora, em uma democracia consolidada é de se esperar que os partidos sigam tais conteúdos programáticos: os cidadãos deveriam ler e, por isso, darem o seu voto de confiança, ou não. O problema é quando as tais agremiações não existem enquanto partidos reais que obedecem seus programas, mas agem como torcida organizada de futebol. Afinal, torcer por um time de futebol não requer o uso da razão: um dia o indivíduo ouviu falar ou assistiu a uma partida de jogo e resolveu que, daquele momento em diante, seria um torcedor. Se o time de futebol decide o campeonato e se classifica dá alegria aos seus torcedores; ou, se perde todos ficarão entristecidos. Com partido político a situação é diferente: estarão no jogo as decisões mais importantes da sociedade, decisões que vão afetar diretamente a vida material de cada um dos eleitores.

quarta-feira, 10 de agosto de 2016

O Valor e a Vida

Um termo que é usado em variadas ciências, e sempre com no bastante diversidade, é valor; isso porque em cada disciplina toma uma forma diferente, assim como a sua importância e necessidade. Na Economia, por exemplo, valor pode ser a quantidade de trabalho empregada para se produzir um bem, já em Marketing, o valor de um produto é a expectativa de um consumidor quanto aos benefícios recebidos. Por outro lado, alguns teóricos, críticos ao sistema capitalista de produção e sua moral, vêm-no com uma determinada contrariedade, já que encontram no termo um conservadorismo a ser extirpado. No entanto, esse é um termo indispensável para um estudo político e entendimento social: é objeto de estudo da Antropologia, da Sociologia e é tratado pela Filosofia como elemento primordial na busca por um entendimento das práticas humanas. O termo vem do latim (valore) e exprime uma relação direta entre as necessidades do indivíduo (comer, possuir, reproduzir, prazer, dominar, comparar etc.) e a capacidade das coisas e seus derivados, objetos ou serviços satisfazerem o pensamento racional do indivíduo. E é na apreciação desta relação que se explica a existência de uma hierarquia entre os valores segundo a prioridade das tais necessidades e a capacidade dos objetos em as satisfazerem, diferenciadas no espaço e no tempo. De um modo geral pode-se dizer que os valores são criados e recriados na sociedade e repassados através da convivência nas instituições como família, igreja, escola, clube etc. A razão de existência das instituições é exatamente a força de coerção e de sanção que estas exercem sobre os indivíduos, dando-lhes um modo de ver o mundo e de ver a si próprios no mundo. Portanto não é a mulher que é bela, mas são valores estéticos do observador que a definem como bela; não é o roubo, o estupro, ou o assassinato que são péssimos em si mesmos, mas são os valores do observador que os definem enquanto tal. Da mesma forma pode-se afirmar que, para algumas pessoas, um assassinato pode custar quinhentos reais ou uma pedra de crack, enquanto, para outros, não se pode imaginar qualquer ato que encerre a existência de alguém. Quer dizer: a vida não tem valor, mas as pessoas podem ou não, dar valor a vida.

segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Felicidade

Duas situações: primeira, as pessoas vivem a cada dia, a cada minuto, procurando sempre um sentido para suas vidas; segunda, não conseguem ver a felicidade, ou o prazer, como sendo esse o sentido. Por esse motivo algumas pessoas entendem que a razão de suas existências reside na religião, outros nas ciências, outros na política, ou na aquisição de bens materiais. Não percebem que, ao mirarem suas atenções para esses setores, estão mesmo é procurando a sua felicidade, o seu prazer. A propósito desse tema, o pensador grego, Epicuro (século III aC), afirmou que a razão existência de todo e qualquer ser vivo é sempre a busca de condições melhores para existir. Isso quer dizer: qualquer humano vive, continuamente, em busca da felicidade, um estado caracterizado pela “aponia”, a ausência de dor e “ataraxia” ou, a imperturbabilidade da alma. Seriam essas as melhores maneiras de medir as referências do que é bom e do que é ruim. Acontece que se as pessoas assumissem que o sentido da existência humana é a busca por melhores condições para existir, deveriam direcionar suas caminhadas em uma busca do prazer, da felicidade. Aliás, a palavra prazer tem sido usada como situação de vida desregrada, de vida egoísta, ou de quem não se preocupa com o futuro, mas isso se distancia do seu sentido original: a felicidade. A fonte do prazer pode ser a comida, portanto as pessoas devem comer; beber também pode ser motivo de prazer e as pessoas devem beber; assim como fazer sexo é algo que dá prazer e as pessoas devem fazê-lo. No entanto, comer além do que se deve, ou o que deve, pode não ser prazeroso, mas algo que traga um grande sofrimento a posteriori; da mesma forma, o beber além da conta e em situações inadequadas pode trazer um grande sofrimento; assim como fazer sexo de forma indevida pode afastá-lo do prazer e, em seu lugar, ter de enfrentar um grande sofrimento. Da mesma forma o respeito ao outro. Viver prazerosamente é também ser respeitado pelo maior numero de pessoas; ora, a melhor forma de ser respeitado é respeitar também as pessoas. Assim, o objetivo de cada um é mesmo a busca da felicidade. O problema é quando não se sabe que a reforma da casa, o carro novo e mesmo o céu no após a morte é sempre essa busca. Pois a felicidade, ou o prazer, pode sim estar na religião, como pode estar na política, na ciência, ou no trabalho, assim como na reforma da casa ou no carro novo etc; mas as pessoas devem saber que são elas que fazem a felicidade não o objeto ao qual se direcionam. São as pessoas que fazem de suas ações um motivo de suas felicidades.

sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Quem é de Direita?

Na condição política brasileira atual, em meio a todo esse debate que tem acontecido, há que se fazer um esclarecimento sobre o conceito de direita; pelo menos sobre aquilo que os filósofos e cientistas políticos têm definido enquanto tal. Isso porque aquele que não se identifica como de esquerda não necessariamente é de direita, pode ser apenas alguém inocente, desinformado e com medo das mudanças sociais, repetindo noções políticas que outras pessoas passaram. Assim como o termo, direita, não deve ser usado como sinônimo de defensores do capitalismo. Nos Estados Unidos da América e na Europa pessoas adeptas da economia de mercado podem ser classificadas como progressistas e até inovadoras; elas não são de esquerda, mas é muito comum chamá-las simplesmente de direitistas. Da mesma forma, não se pode relacionar totalitarismo com direita, ou com militarismo, já que muitos governos empunhando bandeiras de esquerda foram governos fortes e totalitários. Aliás, essas simplificações, ou limitações, não ajudam, antes pelo contrario, prejudicam um entendimento do objeto em questão e mesmo a busca de soluções políticas à sociedade. Direita é uma tendência ideológica que defende uma economia conservadora e que, por sua vez, as práticas desembocam em uma política da mesma forma conservadora. Ou seja: são os ideais de indivíduos que, por acumular riquezas, a economia de mercado é mais adequada aos seus interesses; por outro lado, as mudanças profundas na sociedade (a liberação do aborto, o casamento de homo-afetivos, as leis anti-racismo etc.) são encaradas como potencialmente perigosas para a manutenção de seus interesses. Sua gênese, por tanto, está nessa elite econômica nacionalista, preocupada em defender seus interesses que, para isso, elegem governantes e parlamentares engajados na manutenção de uma ideologia com tais características. Quando essa tendência se fortalece sobremaneira, pode desembocar em sistemas de governos fascistas, com um nacionalismo xenófobo e preconceituoso. Quer dizer: aquele que não tem uma leitura e uma atuação efetiva na política, que não sabe exatamente o que são esses conceitos, não pode simplesmente ser qualificado como sendo de direita. Muitas dessas pessoas se soubessem exatamente do que estão tratando, se soubessem o que ocorre a sua volta e como tudo isso tem a ver com suas vidas, tomariam outras posições.

quarta-feira, 3 de agosto de 2016

Política, Democracia e Complexidade

A Política em si é uma ciência humana complexa por excelência, devido a uma serie de motivos e, até porque, trabalha com conceitos ainda mais complexos e difíceis de traçar uma definição. Democracia é um desses exemplos, que ao longo da história – principalmente na idade antiga e moderna – usou-se de forma bastante diferente e servindo aos interesses mais variados. Em primeiro lugar, a complexidade da Ciência Política é a mesma da Sociologia, da Antropologia, do Direito, da Psicologia, entre outras; todas têm o humano como objeto e sujeito, o que dificulta a separação entre o homem que pesquisa e o homem pesquisado. No caso da Política a área tem o agravante de ser uma disciplina que tem como nexo causal o conflito social e, com ele, os jogos de poder. Ou seja: essa ciência tem que dar conta das relações sociais em que falam muito alto as paixões, os interesses individuais e de grupos e o entrelaçamento das conjunturas históricas. O que mais dificulta a compreensão da política, e que leva o seu debate para o senso comum, é a imensidão de palavras usadas comumente e conceituadas de formas bastante diferentes entre os interlocutores. Democracia, por exemplo, é uma expressão trazida da Grécia antiga para a modernidade com o intuito de se ter um conceito que confrontasse às monarquias absolutistas europeias dos séculos 17, 18 e 19 que foi adotada por uma noção de politicamente, mas que tem se distorcido de tal modo que, nos tempos atuais, é possível encaixá-la de forma variada e em mais diferentes situações. Aliás, democracia é usada atualmente na forma mais bizarra e escrachada de tal maneira que é possível um governante, sabidamente inescrupuloso e autoritário, usá-lo como reforço de seu sistema, inclusive perseguindo pessoas que o qualifiquem como antidemocrático. Assim como também é possível pessoas reafirmarem a democracia defendendo sistemas opressores, segregadores e racistas. Lado a lado com a democracia, caminham outros conceitos, aparentemente mais evidentes, mas que observando calmamente percebe-se, são tão complexos quanto, como: liberdade, nação, povo, terra etc. E, então, toda essa complexidade de conceitos, objeto e métodos gera um desconhecimento por uma parcela expressiva da sociedade, mas - como isso acontece com um aparente entendimento por todos – facilita-se a dominação de grupos privilegiados.

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Filosofia: os Humanos e Seus Espantos

Os humanos são seres da filosofia porque necessariamente filosofam. Filosofam quando se deparam com o mundo que o cerca ou, quando se espantam consigo mesmos e procuram respostas, indagam-se qual a razão das suas existências e de todas as coisas. Perguntam sempre: por que algo existe? E o que não existe, por que não existe? Já se falou que a filosofia é autofágica porque a sua essência é a busca por respostas, mas - quando as encontra, elimina o sentido de sua própria existência, o questionamento. Etimologicamente filosofia do grego Φιλοσοφία que, literalmente, quer dizer: amigo da sabedoria ou aquele que ama o saber; portanto é um estudo de problemas fundamentais que dizem respeito existência, ao conhecimento, à verdade, aos valores morais e estéticos, à mente e à linguagem. Por isso, nos tempos atuais, alguns insistem que o papel da filosofia é refletir sobre os mais variados setores dos conhecimentos e da vida humana em geral; mas, outros, que o seu papel é a criação e recriação, de conceitos. Faz filosofia uma criança que, aos três ou quatro anos, vive a perguntar por que as coisas são do jeito que são; quando um adulto não a responde satisfatoriamente, ela pergunta novamente, “mas por quê?” Ela é apenas um ser da espécie humana que existe há apenas alguns anos e se espanta com consigo e com o mundo a sua volta e pergunta. Faz filosofia quando qualquer indivíduo busca respostas. Nos tempos atuais se divide as ciências em química, física, direito, sociologia etc; e uma disciplina chamada filosofia. Na antiguidade, porém, todos os conhecimentos estavam agrupados no “amor ao saber”; o filósofo era aquele que busca o saber. De certa forma isso ainda é assim nos tempos atuais e pode-se dizer que a busca pelo saber – qualquer saber é o seu sentido. No entanto, com as divisões e suas especialidades: alguns passaram a fazer perguntas sobre vida e se fecharam em uma disciplina chamada de Biologia, outros passaram a fazer pesquisas sobre os astros e criaram uma disciplina chamada de Astronomia. Outros se debruçaram sobre temas como a aplicação das leis em uma sociedade, outros sobre passaram a estudar os temas relacionados apenas a saúde, sobre a cultura e assim por diante. O que resta a Filosofia? O que resta ao filósofo moderno, aquele que na modernidade quer levar em frente essa disciplina, aquele que ser pensar, ensinar, e escrever a respeito? Se não necessita que pense a Biologia ou de outra área, mas se faz necessário pensar o papel do atual biólogo, do físico, do médico, do jurista, de suas produções científicas e assim com todas as disciplinas que reivindicam para si o status de ciência. Aquilo que dissera Aristóteles, de que a gênese da filosofia está no espanto, permanece nos dias atuais; mesmo que se façam ciências e se achem respostas, continuam os espantos com o que se fazem e com seus resultados. E, assim, de forma interminável.