quinta-feira, 19 de junho de 2014
Enquanto a Banda Passava
Eu "estava atoa na vida, o meu amor me chamou pra ver a banda passar cantando coisas de amor" e assim ouviram-se, ao longe, os acordes: a música invadia a avenida e a banda passava. A vida passa. Alguns lutam, enfrentam as agruras, as adversidades para que a banda siga seu curso, outros - por desconhecerem os acordes, fazem oposição. Mas a banda passa, queiramos nós, ou não.
Se o velho fraco esqueceu do cansaço e pensou que ainda era moço pra sair no terraço e dançou, a moça feia debruçou-se na janela, pensando que a banda tocava pra ela. Mas a banda tocava para ela. A banda tocava para ela, para o velho fraco, para o faroleiro, para o fanfarrão, para o sábio e para o tolo; quando a banda passa, toca para todos. Os acordes de mudanças são para todos, embora nem todos conheçam os acordes.
A verdade é que o faroleiro que contava vantagem parou e a rosa triste que vivia fechada se abriu. A banda é feita por pessoas que seguem, caminham pela rua, se juntam a mais pessoas, mesmo que alguns não aceitem que a gente sofrida despeça-se da dor e acompanhe, cantando coisas de amor.
Porque, depois que a banda passa, vai cada um para o seu lado e cada qual para o seu canto e para cada canto vai uma dor. Mas aí, tudo que era para acontecer, já aconteceu, a banda já passou e já não se canta mais coisas de amor.
Diante da peça em execução, o sábio pondera, se afasta ou participa e tenta contribuir, mas o tolo, o fanfarrão, sem saber o que toca a banda, não aceita que a canção se execute e faz ruídos. É preciso que se conheça a melodia e a letra, a composição como um todo, o começo, o meio e o fim. O tolo, não sabe do que se trata, ouviu falar que a banda está fora do ritmo, que os acordes não acontecem no tempo certo e, por isso, fecha a janela de frente pra rua.
Quando Chico Buarque compôs, pensou: se a banda passa na rua, precisa-se ver e ouvir, tomar partido no processo e seguir em frente: o homem sério que contava dinheiro e a moça triste que contava estrelas, param para ver, ouvir e dar passagem. Se não ver, ouvir, dar passagem e acompanhar, a banda passa, a história acontece, a realidade muda e o fanfarrão fica de fora.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário