sexta-feira, 3 de novembro de 2017

A Morte e a Angústia do Fim

Um pouco mais de 300 anos de separação, dois povos, dois homens, dois enfrentamentos a um poder central, duas condenações e dois modos de encarar a morte: de um lado Sócrates de Atenas e, de outro, Jesus de Nazaré. A forma como viram o mundo e a sociedade estiveram retratados nos modos como foram publicadas as suas mortes e assim se inscreveram na cultura do Ocidente. 
Um foi acusado de corromper a juventude e de blasfemar contra os deuses; por isso, foi levado a julgamento, fez sua própria defesa, mostrou a incoerência dos seus detratores, reafirmou suas convicções e foi condenado. Em seus minutos finais  teria conversado com os discípulos e afirmado que não se deve temer a morte: "eu vou para a morte e vocês para a vida. Quem de nós tem o melhor destino?"
O outro foi acusado de heresia por se dizer o filho de Deus e encarado como alguém perigoso, portanto era preciso matassem-no antes que tivessem de matar a tantos outros com suas ideias. Por isso foi levado a julgamento diante dos homens da lei, dos sacerdotes e de governantes. Condenado a morte por crucificação, em um espetáculo público conduziu seu instrumento de morte até o local da execução e, em seus minutos finais, teria exclamado: "pai, em tuas mãos entrego o meu espírito".
Nesses dois mil e tantos anos o modo como os dois encararam suas morte, em continuação de seus pensamentos, entrou definitivamente na alma humana e construiu um imaginário que até hoje emoldura um modo de pensamento, com suas noções de verdade e estrutura moral. Se os discípulos de Sócrates se preocuparam em descrever a morte do mestre como um momento de questionamentos,  os discípulos de Jesus descreveram como um momento de volta para o reino de Deus. Mas a morte dos dois foram descritas como grandes passagens, distantes e estranhas.
Acontece que o homem vive um hiato entre a vida e a morte e os ocidentais aprenderam a ver essa relação como a existência de algo que o espreita sem qualquer controle efetivo e que dirige os destinos.
Dois modos de encarar o que mais atormento o espírito, uma angústia: o que pode haver para além do suspiro final, um grande pai a esperar e para julgar os feitos dos filhos como bons ou maus, ou um nada que nos aguarda a todo instante? Os homens ocidentais inventaram máquinas, teorias filosóficas, toda a sorte de ciências, foi a lua, acumulou riquezas, mas não consegue se encontrar com seu próprio destino: um pai a julgar suas ações ou a eternidade de um nada.

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