O mundo entrou, nas últimas décadas, em uma dicotomia perversa e de difícil saída, de um lado não se aceita a pecha de conservador, com falas de avanços e inovações, fascinados pelas novas tecnologias, de outro, um agir medroso e uma crença generalizada de que as decisões políticas e institucionais devem retroceder. Um saudosismo. Dicotômica e perversa porque põe a sociedade em uma certa berlinda: de um lado não consegue avançar em um curso natural e, de outro, não sedimenta condutas e relações estáveis necessárias.
Mas o interessante desse conservadorismo é o argumento usado para a defesa da manutenção das coisas do jeito que pensa que sempre deveriam ser; mesmo que sejam país relapsos e que não acompanhem a vida escolar dos filhos, mesmo que não tirem tempo para se dedicar aos filhos, argumentam a defesa da família. Alguns fazem discursos em defesa das instituições nacionais, mas corrompem a ordem na hora de declarar seus impostos; outros transformam a crença do povo em balcão de negócios, mas falam em manutenção de uma "fé viva".
Tanto as coisas materiais quanto às ideias, bem como as relações entre as ideias e a produção material, sofrem alterações constantes e isso sempre influenciou as artes, a filosofia, as ciências, as religiões e a política, de modo que tudo muda. Acontece que essas alterações provocam medos às mentes médias e menores, com dificuldades para perceber que há uma totalidade e, nessa, uma constância de mudanças.
Mas o pavor com às alterações é naturalmente compreensível, desde os tempos mais remotos houve movimentos reacionários com pensamentos de que tudo tem de ser estancado, segurado, contornado. As grandes revoluções transformadoras da história sempre foram seguidas de períodos restauradores, de retrocessos e, em geral, com terror e crueldades.
O que foge da normalidade não é o querer parar ou diminuir o concurso de mudanças, mas o pensamento de que é possível fazer os pensamentos voltarem às condições que já foram há bastante tempo, há séculos até, como é o caso de discussões recentes na defesa da "terra plana", por exemplo. Talvez isso se explique pelo fato de que conservadores e ciências não se encontrem em uma mesma sintonia: se o conservadorismo tem pavor ao novo, as ciências são implacáveis, as suas existências são marcadas pelo novo, pelo diferente. O conservador não sabe, mas por mais que grite e esperneie, não é possível segurar, tudo muda, até ele mesmo.
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