A não ser que seja um eremita a viver escondido nas montanhas, ou um náufrago perdido em uma ilha deserta, as pessoas existem nas sociedades e nelas desempenham papéis, quer sejam papéis exclusivos para determinadas instituições ou delimitados politicamente para servir ao estado e, consequentemente, às pessoas de um modo geral. Mas entre os papéis que lhes foram confiados, suas especificidades e categorias, conforme foram pensados pelo corpo de legisladores, e a sociedade precisa e espera, há diferenças profundas.
O ministro da Saúde, por exemplo, não será ministro da Saúde se não estiver efetivamente preocupado com a administração da saúde, mas com os interesses de determinados grupos em partícular. Da mesma forma o professor não será professor se não estiver preocupado com o ensino dos conhecimentos necessários para o jovem em formação, mas apenas em cumprir um período de permanência em sala de aula.
Determinados juízes são contratados pelo Estado para desempenharem a função de juiz, mas atuam como políticos, com discursos, estratégias de ataque e defesa e articulações junto aos meios de comunicação tradicionais e das redes sociais da internet. Esses não são juízes. De um juiz se espera uma sobriedade, seriedade, imparcialidade: independência das paixões do conflito na administração da justiça.
Igualmente, não se pode ter como policial uma pessoa mal-caráter que por acaso passou em um concurso público, vestiu uma farda e por isso está na ruas a fazer tudo ao contrário do que se espera da atividade militar. Mas a vida pública não é diferente do que ocorre na vida civil, ou eclesiástica: o empresário que faz discursos por lealdade na concorrência, mas é desleal com aqueles da sua categoria e com seus clientes, ou o profissional liberal que não desempenha efetivamente a função que se propôs nos bancos acadêmicos, ou o religioso que desvia suas funções como orientador dos preceitos religiosos.
E a lista segue extensa se formos descrever e exemplificar cada uma das funções de homens públicos, legitimamente contratados para funções específicas, mas que desviam seus afazeres priorizando suas vontades e necessidades. Talvez, se esse ensaio fosse lido por um norte-europeu, diria-me ele: "como podes levantar temas dessa natureza e descrevê-los, como se vivêssemos ainda nas bordas da Idade Média?" Teria eu de dizer: "sim, vivemos isso em nosso país, em pleno ano 2018 da era cristã".
Alguém poderá também argumentar: "mas não são todos os professores", "não são todos os profissionais liberais a agirem dessa maneira". E é verdade, felizmente não são todos. Mas existem esses. Se o cesto tiver dez maçãs, e dessas, uma podre, terá uma podre que deverá ser lançada fora. As nove sãs não recuperam uma estragada, mas essa uma estragada põem a perder as outras nove.
Essas pessoas se distanciam das atividades esperadas pelo conjunto da sociedade por dois motivos: ou por ignorância de que a sociedade necessita para um bom andamento que seus indivíduos executem fielmente as funções às quais foram contratados; ou por serem mesmo de ma-índole e acreditam que o restante da sociedade deve estar ao seu dispor. Os dois casos são muito difíceis de reverter, já que ambos os comportamentos são frutos da educação: o primeiro, da educação formal porque cada vez menos discute a própria sociedade e, o segundo, é fruto da educação informal que repassa vícios e malvadezas pelos exemplos. E a coisa segue.
Nenhum comentário:
Postar um comentário