segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Acidente. O Que é Isso?

Algumas palavras são cunhadas primitivamente para designar algo muito próprio, mas com o tempo acabam caindo no senso comum com uma noção um tanto diferenciada do original: esse é o caso do termo ‘acidente’. Diferente do o usado comumente como algo catastrófico, o termo não tem como sinônimo, tragédia, perda, desastre, desgraça ou fatalidade. O entendimento dessa forma indica a falta de conhecimento filosófico, já que acidente pode designar o outro lado, o cuidado, o ganho, a graça, o carinho, ou a dedicação, caso isso não seja algo que aconteça sempre. Acidente fora uma das categorias usadas por Aristóteles, na Grécia antiga, quando tratou da Metafísica, na sua oposição ao pensamento do mestre, Patão. Para ele, o termo precisa ser entendido de forma correlata a outro termo, essência - que também é um daquelas expressões que entraram no senso comum um tanto diferente do seu original. Na oposição a Platão, Aristóteles afirmou que não existem dois mundos, mas apenas um dotado de substâncias e, essas, de acidentes e essências. Explicando: para que um objeto seja entendido como ‘casa’ é precisa que possua uma série de pontos entendidos como a essência de tal objeto, mas todas as ‘casas’ são dotadas também de acidentes, aqueles pontos que as diferencia. Ou, um objeto entendido como ‘humano’; por que é possível olhar para as pessoas e entende-las como humanas? Ora, todas elas possuem uma essência que lhes aproxima e as identifica; mas por que, ao olhar as tais pessoas, percebe-se que são diferentes entre si? Porque todas possuem acidentes que lhes diferenciam. Em outras palavras: por que se olha para um objeto e se identifica como ‘casa’? Porque o referido objeto é dotado de portas, janelas e coberturas que são pontos essenciais para caracterizá-la como tal? No entanto, cada casa é diferente da outra na cor, no tamanho, no modelo, nos tipos de portas e janelas etc. Ou seja: as casas são dotadas de acidentes que diferenciam uma da outra. Da mesma forma quando se olha uma pessoa e se percebe como tal; as pessoas possuem uma essência humana, algo que perpassa a todas e lhes aproxima, mas também todas são dotadas de acidentes, o tamanho do nariz, da boca, a cor do cabelo etc. Por tanto, essência é aquilo que se repete em todos os elementos do gênero e, acidente, não é o catastrófico, o terrível, mas aquilo que não é comum aos indivíduos de um grupo, aquilo que não se repete. Por isso, quando se quer suavizar um fato, trata-se como algo que não é comum que aconteça, trata-se como acidente.

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