quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

A Lawfare

A decadência do estado moderno se mostra tanto nas relações entre os poderes quanto nos seus mecanismos de ação, com práticas que acabam deteriorando as instituições em suas bases mais fundamentais. Uma dessas práticas, muito recente, por enquanto atende apenas pelo nome em Inglês, lawfare já faz parte de grandes debates de juristas e cientistas sociais das grande universidades pelo mundo a fora. 
O que a, grosso modo, pode ser definido como uma simbiose entre judiciário e legislativo é, mais propriamente, uma prática que faz uso da força jurídica com fins de interferências políticas. A ação tanto pode ter como alvo a prisão de um dos atores do jogo político como forma de alterar a disputa eleitoral, quanto pode - o que é mais comum - envolver alguém em processos jurídicos como forma de desgasta-lo a exaustão, até que caia no descrédito popular.
Alguns traduzem lawfare como "guerra suja", mas em certos países de língua inglesa aparece também como SlAPP, sigla de strategic lawsuit against public participation (ação judicial estratégica contra a participação pública). No início dos anos 80 do século passado, o governo dos Estados Unidos teria contratado algo dessa natureza na Universidade de Harvard, que teria elaborado uma nova estratégia de guerra, não mais com uso de armamentos convencionais, mas o próprio Direito; de forma tal que, ao passo que derrota o inimigo, o faz com a legitimidade popular. 
Acontece que os custos para manter um país com o poderio dos Estados Unidos da América são bastante altos, o que não pode acontecer sem a participação de países periféricos com suas economias dependentes. Mas se os governos desses países não forem alinhados e recusarem a submissão, algo precisa ser feito, só que as intervenções militares de outrora geram custos altos com perdas de vidas e não se consegue fazer sem um desgaste popular.
E aí, o conceito de lawfare, por mais que se traduzam como "guerra suja", é na verdade uma guerra limpa, já que não envolve tantas pessoas, só o estritamente necessário; se receber o apoio midiático, além de limpa a guerra será eficaz, terá apoio popular e os protagonistas vistos como heróis. O problema é que com isso a democracia, sistema político balizado no tripé de Montesquieu, recebe um golpe fulminante e seu construto, o estado moderno, começa perder os seus sinais vitais.

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