Como é possível uma sociedade complexa existir, em plena era chamada de pos-modernidade, com uma população alheia à sua própria condição de cidadã? Parece estranho, mas isso existe; é só olhar ao redor e perceber que países subdesenvolvidos são assim, distantes dessa condição. Acontece que cidadania é palavra indispensável para se pensar as relações sociais que se pretendam democráticas, tanto entre os membros, quanto entre esses e os seus aparelhos burocráticos. Parece impossível, mas algumas sociedades não são verdadeiramente sociedades, mas amontoados de humanos, pessoas com vida pública desconectada de seus deveres, de seus direitos e sem a mínima compreensão da estrutura e funcionamento dos aparelhos estatais.
Ora, o conceito é indispensável para pensar a relação do indivíduo com os demais membros do grupo e desses com a estrutura em questão tendo em vista que tem na sua essência exatamente as expressões de conhecimento e participação social. Cidadania, já na sua origem é pensada como o conhecimento e participação nas coisas da cidade: quais são as regras, os direitos e os deveres? Quem são as lideranças? O que fazem? E assim por diante.
É possível não existir cidadão sim quando não há de fato uma sociedade, mas um amontado de pessoas, desconectadas dos seus direitos e de seus deveres, pessoas que põem fé em tudo que assistem nas redes sociais, na televisão, ou nos jornais tradicionais. E mais, pessoas não têm lideranças porque o que têm não são líderes, mas chefes a usarem a máquina do estado e de toda a sorte de artifícios para manterem suas vontades, seus privilégios e suas ideologias.
Por mais que se chame de legislativo como tal, esse "poder" legisla e fiscaliza em função de suas necessidades e interesses particulares, da mesma forma o executivo, existe em função daqueles que custearam suas campanhas eleitorais; e também não é diferente com o judiciário, que não julga, mas decide por conveniências de interesses ideológicos, econômicos e até religiosos. Como haver cidadania em um estado que os poderes não se conectam e os outros aparelhos estatais não se consideram como ligados aos demais poderes? Tribunais de conta, ministério público, banco central, polícia federal e forças armadas não estão conectados a qualquer dos ditos poderes constituídos: alguns até fazem de conta que estão ligados ao executivo e nada mais.
Qualquer pensador contratualista diria que isso é o "estado de selvageria" e os hobbesianos diriam ainda que é a luta de todos contra todos, homens, como lobos, a devorarem uns dos outros. E o que se pode dizer disso é que entre lobos não não existem cidadãos. Não há cidadania se as pessoas não são capazes de raciocinar sobre suas próprias vidas, se se deixam levar, se são enganadas, se são exploradas, e pior, fazem isso com a crença de serem expertas. Não há cidadania se não possuem a menor ideia do mundo que o cerca.
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ResponderExcluirSua docência nos faz falta meu caro! Em relação a postagem, percebo que a maioria se enquadra como um amontado de pessoas, desconectadas dos seus direitos e de seus deveres, pessoas que põem fé em tudo que assistem nas redes sociais, na televisão, ou nos jornais tradicionais, como relatou o nobre professor. Fato!! E nada se faz para reverter o cenário. A minoria é sufocada no meu entendimento.
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